SOLENIDADE BATISMO DO SENHOR (ANO B)

A PALAVRA

A liturgia deste dia celebra o Batismo de Jesus. Evoca o momento em que Jesus, ungido pelo Espírito Santo e apresentado aos homens como Filho Amado de Deus, abraçou a missão que o Pai lhe entregou: recriar o mundo, fazer nascer um Homem Novo. E propõe-nos, a todos nós que fomos batizados em Cristo, que tiremos desse facto as consequências que se impõem.

A primeira leitura (Is 42,1-4.6-7) anuncia um misterioso Servo, escolhido por Deus e enviado aos homens para instaurar um mundo de justiça e de paz sem fim… Investido do Espírito de Deus, ele concretizará essa missão com humildade e simplicidade, sem recorrer ao poder, à imposição, à prepotência, pois esses esquemas não são os de Deus.

No Evangelho (Mc 1,7-11), aparece-nos a concretização da promessa profética da primeira leitura: Jesus é o Filho/”Servo” enviado pelo Pai, sobre quem repousa o Espírito e cuja missão é realizar a libertação dos homens. Obedecendo ao Pai, Ele tornou-Se pessoa, identificou-Se com as fragilidades dos homens, caminhou ao lado deles, a fim de os promover e de os levar à Vida em plenitude.

A segunda leitura (At 10,34-38) reafirma que Jesus é o Filho amado que o Pai enviou ao mundo para concretizar um projeto de salvação em favor dos homens; por isso, Ele passou pelo mundo fazendo o bem e libertando todos os que eram oprimidos. É este o testemunho que os discípulos devem dar, para que a salvação que Deus oferece chegue a todos os povos da terra. 

Fonte: Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus 

Leituras

Ao sermos batizados e recebermos o Espírito, somos chamados a seguir o exemplo do ‘Servo de Javé’, tornando-nos instrumentos de Deus na renovação do mundo. Assumir nossa responsabilidade profética significa estender a mão aos pobres, oprimidos e àqueles que vivem nas sombras, demonstrando solidariedade ativa, ajuda fraterna e partilha generosa.

Assim fala o Senhor:
1 “Eis o meu servo — eu o recebo;
eis o meu eleito — nele se compraz minh’alma;
pus meu espírito sobre ele,
ele promoverá o julgamento das nações.
2 Ele não clama nem levanta a voz,
nem se faz ouvir pelas ruas.
3 Não quebra uma cana rachada
nem apaga um pavio que ainda fumega;
mas promoverá o julgamento para obter a verdade.
4 Não esmorecerá nem se deixará abater,
enquanto não estabelecer a justiça na terra;
os países distantes esperam seus ensinamentos.
6 Eu, o Senhor, te chamei para a justiça 
e te tomei pela mão; eu te formei e te constituí 
como o centro de aliança do povo, luz das nações,
7 para abrires os olhos dos cegos, tirar os cativos da prisão, 
livrar do cárcere os que vivem nas trevas”.
Palavra do Senhor.

Que a paz divina abençoe e guie constantemente o povo com serenidade.

R. Que o Senhor abençoe, com a paz, o seu povo!

1a Filhos de Deus, tributai ao Senhor, * tributai-lhe a glória e o poder!
2 Dai-lhe a glória devida ao seu nome; *
adorai-o com santo ornamento! R.

3a Eis a voz do Senhor sobre as águas,*
3c sua voz sobre as águas imensas!
4  Eis a voz do Senhor com poder!*
Eis a voz do Senhor majestosa. R.

3b Sua voz no trovão reboando!*
9b No seu templo os fiéis bradam: “Glória!”
10 É o Senhor que domina os dilúvios, *
o Senhor reinará para sempre! R.

Assumimos o compromisso de, como cristãos batizados e ungidos pelo Espírito, seguir os passos de Jesus, distribuindo em gestos concretos a bondade, misericórdia, perdão e amor de Deus, empenhando-nos na libertação daqueles oprimidos pelo demónio do egoísmo, injustiça, exploração, exclusão, solidão, doença, analfabetismo e sofrimento?

Naqueles dias,
34 Pedro tomou a palavra e disse:
“De fato, estou compreendendo
que Deus não faz distinção entre as pessoas.
35 Pelo contrário, ele aceita quem o teme
e pratica a justiça,
qualquer que seja a nação a que pertença.
36 Deus enviou sua palavra aos israelitas
e lhes anunciou a Boa-nova da paz,
por meio de Jesus Cristo, que é o Senhor de todos.
37 Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia,
a começar pela Galileia, 
depois do batismo pregado por João:
38 como Jesus de Nazaré foi ungido por Deus
com o Espírito Santo e com poder.
Ele andou por toda a parte, fazendo o bem 
e curando a todos os que estavam dominados pelo demônio;
porque Deus estava com ele”.
Palavra do Senhor.

Como batizados em Cristo, recebemos o mesmo Espírito que ungiu Jesus no Jordão, abraçando a missão de construir o Reino de Deus. Nosso compromisso batismal não deve ser apenas uma assinatura em um registro, mas sim uma jornada constante de seguir Jesus, colaborando ativamente na cura do mundo e na construção de um ambiente mais fraterno e humano.

Naquele tempo,
7 João Batista pregava, dizendo:
“Depois de mim virá alguém mais forte do que eu.
Eu nem sou digno de me abaixar
para desamarrar suas sandálias.
8 Eu vos batizei com água,
mas ele vos batizará com o Espírito Santo”.
9 Naqueles dias, Jesus veio de Nazaré da Galileia,
e foi batizado por João no rio Jordão.
10 E logo, ao sair da água, viu o céu se abrindo,
e o Espírito, como pomba, descer sobre ele.
11 E do céu veio uma voz:
“Tu és o meu Filho amado,
em ti ponho meu bem-querer”.
Palavra da Salvação.

Reflexão

BATIZADO OU PASSADO PELA ÁGUA?

Quando eu era criança, de vez em quando, minha mãe nos preparava para o jantar “ovos passados por água quente”. Isto é: um ovo que não é cru nem cozido, mas que ficou em água fervente, sem terminar de cozinhar. A receita não era do meu agrado. E eu sempre perguntava à minha mãe por que ela não cozinhava completamente, por que ela deixava meio cru. E ela sempre me dizia: porque este não é um ovo cozido, mas um ovo passado por água quente.

O que têm ovos passados por água quente a ver com o batizado? Pois bem, “BATIZADO” significa literalmente “MERGULHAR“, afundar na água – como se afogasse ou morresse – “COZINHAR” no calor do Espírito, para parecer como uma nova pessoa, como um “NOVO HOMEM“, como um “RESSUSCITADO“. Ser batizado é deixar que a água e o Espírito me transformem profundamente. Melhor dizendo: transformam-me com o tempo, porque é um processo existencial. Nem tudo acontece ao mesmo tempo, e o batizado também tem que fazer algo de sua parte (assim como a Comunidade Cristã que o acolhe).

O Batismo de João foi um pouco como “passar pela água”: significava “reconhecer-se como pecador” e “querer mudar de vida”. Foi um “BATISMO DE CONVERSÃO PARA PERDÃO DOS PECADOS“, de abertura ao futuro Messias que estava para chegar. Mas a coisa não foi muito além: não recebiam perdão dos pecados pelo fato de serem batizados, era apenas uma atitude, um sinal. É por isso que o batismo que Jesus recebe e o batismo cristão são profundamente DIFERENTES. O BATISMO CRISTÃO está relacionado com a PÁSCOA DE JESUS E COM O ENVIO DO SEU ESPÍRITO, com integração na Comunidade eclesial. Não somos batizados “imitando” o exemplo de Jesus, mas participando da transformação que sua PÁSCOA acarreta para o NOVO HOMEM RESSUSCITADO.

Não temos promovido muitos cristãos “aquosos” em nossa Igreja? Cristãos bastante “moles” e frágeis, que “quebram” como um ovo meio cru e se espalham facilmente quando surgem as primeiras dificuldades? Por que existem tantos batizados nos quais não se nota em sua vida nada que expresse que seja cristão? Eles até abandonaram a fé, e sua vida continua sem arrependimentos. Esse “acreditar” não trouxe nada de essencial ou necessário.

Certo número de pais (embora eles próprios tenham sido batizados na época) faz a opção por adiar ou dispensar o batismo de seus filhos. Razões? Bem, não é incomum que eles lhe digam, por exemplo, que não querem “impor” sua fé à criança, que é melhor que ela escolha por si mesma quando for mais velha. Essa “justificativa” parece um pouco “falaciosa” para mim: se fossem inteiramente coerentes com ela, também teriam de se abster de decidir se o levariam ou não para uma escola bilíngue, para não lhe impor outra língua. Ou teriam que desistir de ter mais filhos, para não “impor” aquele que já têm outros irmãos. Tampouco devem escolher levá-lo a um centro público, a uma subsidiária ou ao exterior, até que a criatura decida por si mesma. Nem devem “forçar” qualquer um dos valores ou tradições familiares sobre ele.

A criança não vive seu crescimento pessoal de forma neutra, indiferente, sem nenhuma influência. É impossível. Sua vida não é uma página que pode ficar em branco até que tenha a capacidade de decidir por si, porque as pessoas com quem vive: a família, as diferentes instituições sociais e os ambientes deixam suas marcas nele. Fingir que a criança cresce fora de qualquer influência e depois escolhe livremente é muito ingênuo. “SE NÃO ENSINARMOS NOSSOS FILHOS A SEGUIR JESUS, O MUNDO OS ENSINARÁ A NÃO SEGUIR“. Há também problemas teológicos: o do pecado original e que o filho “precisa” ser purificado desse pecado. Ou se batizá-lo os torna mais filhos de Deus do que os que não são batizados. Não vamos entrar aqui nessas questões, porque seria muito longo para a nossa reflexão.

Mas a verdade é que os pais escolhem mil coisas em nome dos filhos, tudo aquilo que lhes parece melhor, porque os amam incondicionalmente. Se a fé cristã é relevante para eles e afeta suas escolhas e estilo de vida, eles vão querer que seus filhos a compartilhem também. É importante e lindo que, quando os pais recebem o dom de uma vida para cuidar, acompanhar e educar, sejam acompanhados pela bênção de Deus. E no batismo, eles pedem a Deus Pai que ABENÇOE SEU FILHO. Isso nunca faz mal a ninguém. E, ao mesmo tempo, reconhecem que esta vida vem de Deus, que não lhes pertence, que não querem “formá-la” por capricho, nem permitir que a sociedade os forme de acordo com seus interesses, mas sim “COMO DEUS QUER“, com todos os valores e critérios que ajudarão a ser uma pessoa madura, atenciosa, profunda, forte diante das dificuldades.

No Evangelho, Deus Pai proclama publicamente: “TU ÉS O MEU FILHO AMADO, EM TI PONHO MEU BEM-QUERER“, para todo o sempre. E Ele derrama todo o poder de seu Espírito, fazendo-o seu Templo, seu consagrado, seu Messias. Algo semelhante acontece com o nosso Batismo que os pais terão de se preocupar (juntamente com a comunidade cristã, claro) em mostrar-lhes todos os dias o que isso significa, até que possam vivê-lo por si próprios. Toda criança é filha de Deus, – BATIZADA OU NÃO –, mas quem foi batizado (e não passou pela água) poderá conhecer seu Pai que está nos céus, sentir seu amor, sua orientação, sua força e viver cada dia com ele e para Ele.

“Ser batizado com o Espírito de Jesus Cristo supõe encontrar a Deus e saber que somos recebidos por ele em meio à solidão; sentir-se confortado na dor e na depressão; reconhecer-nos perdoados de pecados e mediocridade; sentir-se fortalecido na impotência e expiração; amar e criar vida no meio da fragilidade. Porque ser batizado é viver a vida mais plenamente, viver até os acontecimentos mais simples e insignificantes com mais profundidade. Ousar ser humano até o fim; para não afogar ao infinito o nosso desejo de vida; para defender a nossa liberdade sem entregar o nosso ser a nenhum ídolo; para permanecer aberto ao amor, à verdade, à ternura que está em nós. Para nunca perder a esperança no ser humano ou na vida”. (René Cesa Cantón)

Com que simplicidade e brevidade Pedro o descreveu, ao resumir a vida de Jesus: “Ele andou por toda a parte, fazendo o bem e curando a todos os que estavam dominados pelo demônio; porque Deus estava com ele“. E isso está longe de ser desnecessário em nosso mundo hoje. Em vez disso, é URGENTE e NECESSÁRIO. E o Senhor pode continuar a fazê-lo com a ajuda dos seus discípulos, como seus instrumentos, desde que, em vez de sermos “ensopados”, sejamos cozidos e ensopados pelo FOGO DO ESPÍRITO DO RESSUSCITADO. É muito bom que os batizados comecem o ano revivendo, aprofundando e dando maior testemunho de quem somos: OS FILHOS AMADOS DE DEUS, que também receberam o seu Espírito para viver esta vida fazendo o bem.

Texto: QUIQUE MARTÍNEZ DE LA LAMA-NORIEGA, cmf
Fonte: Comunidade católica Ciudad Redonda (Missionários Claretianos)