A liturgia deste dia convida-nos a contemplar o amor de Deus, manifestado na encarnação de Jesus… Ele é a “PALAVRA” que Se fez pessoa e veio habitar no meio de nós, a fim de nos oferecer a vida em plenitude e nos elevar à dignidade de “filhos de Deus”.
A primeira leitura (Is 52,7-10) anuncia a chegada do DEUS LIBERTADOR. Ele é o rei que traz a paz e a salvação, proporcionando ao seu Povo uma era de felicidade sem fim. O profeta convida, pois, a substituir a tristeza pela alegria, o desalento pela esperança.
A segunda leitura (Hb 1,1-6) apresenta, em traços largos, o PLANO SALVADOR DE DEUS. Insiste, sobretudo, que esse projeto alcança o seu ponto mais alto com o envio de Jesus, a “Palavra” de Deus que os homens devem escutar e acolher.
O Evangelho (Jo 1,1-18) desenvolve o tema esboçado na segunda leitura e apresenta a “Palavra” viva de Deus, tornada pessoa em Jesus. Sugere que a missão do Filho/”Palavra” é completar a criação primeira, eliminando tudo aquilo que se opõe à vida e criando condições para que nasça o Homem Novo, o homem da vida em plenitude, o homem que vive uma relação filial com Deus.
Leituras
A alegria pela libertação do cativeiro da Babilônia e pela “salvação” que Deus oferece ao seu Povo anuncia essa outra libertação, plena e total, que Deus vai oferecer ao seu Povo através de Jesus. É isso que celebramos hoje: o nascimento de Jesus significa que a opressão terminou, e que chegou a paz definitiva, que o “reinado de Deus” alcançou a nossa história. Para que essa “BOA NOTÍCIA” se cumpra é, no entanto,
preciso acolher Jesus e aderir o “Reino” que Ele veio propor.
de quem anuncia o bem e prega a salvação,
e diz a Sião: “Reina teu Deus!”
sabem que verão com os próprios olhos
o Senhor voltar a Sião.
o Senhor consolou seu povo
e resgatou Jerusalém.
todos os confins da terra hão de ver
a salvação que vem do nosso Deus.
Palavra do Senhor.
Aclamai, com os clarins e as trombetas, ao Senhor, o nosso Rei!
R. Os confins do universo contemplaram a salvação do nosso Deus.
1 Cantai ao Senhor Deus um canto novo, *
porque ele fez prodígios!
Sua mão e o seu braço forte e santo *
alcançaram-lhe a vitória. R.
2 O Senhor fez conhecer a salvação, *
e às nações, sua justiça;
3a Recordou o seu amor sempre fiel *
3b pela casa de Israel. R.
3c Os confins do universo contemplaram *
3d a salvação do nosso Deus.
4 Aclamai o Senhor Deus, ó terra inteira, *
alegrai-vos e exultai! R.
5 Cantai salmos ao Senhor ao som da harpa *
e da cítara suave!
6 Aclamai, com os clarins e as trombetas, *
ao Senhor, o nosso Rei! R.
Celebrar o nascimento de Jesus é, em primeiro lugar, contemplar o amor de um Deus que nunca abandonou os homens à sua sorte; por isso, rompeu as distâncias, encontrou forma de dialogar com o homem e enviou o próprio Filho para conduzir o homem ao encontro da vida definitiva, da salvação plena. No dia de Natal, nunca será demais insistir nisto: o DEUS em quem acreditamos é o DEUS DO AMOR E DA RELAÇÃO, que continua nascendo no mundo, apostando no homem, querendo dialogar com ele, a encontrar-se com ele, e que não desiste de um projeto de felicidade para o homem que criou.
nestes dias, que são os últimos,
a quem ele constituiu herdeiro de todas as coisas
e pelo qual também ele criou o universo.
Este é o esplendor da glória do Pai,
Tendo feito a purificação dos pecados,
ele sentou-se à direita da majestade divina,
nas alturas.
Ou ainda: “Eu serei para ele um Pai
e ele será para mim um filho?”
Palavra do Senhor.
A transformação da “Palavra” em “carne” (em menino do presépio de Belém) é a espantosa aventura de um Deus que ama até ao inimaginável e que, por amor, aceita revestir-Se da nossa fragilidade, a fim de nos dar vida em plenitude. Neste dia, somos convidados a contemplar, numa atitude de serena adoração, esse incrível passo de Deus, expressão extrema de um amor sem limites.
e a Palavra era Deus.
para que todos chegassem à fé por meio dele.
8 Ele não era a luz,
ilumina todo ser humano.
mas o mundo não quis conhecê-la.
isto é, aos que acreditam em seu nome,
nem da vontade do varão,
mas de Deus mesmo.
glória que recebe do Pai como filho unigênito,
cheio de graça e de verdade.
O que vem depois de mim
passou à minha frente,
porque ele existia antes de mim”.
na intimidade do Pai,
Palavra da Salvação.
Reflexão
A PALAVRA SE TORNOU CARNE
Proclamar que é Natal significa afirmar que Deus, através do Verbo feito carne, disse a sua última palavra, a mais profunda e bela de todas. Ele a introduziu no mundo e não poderá retirá-la, porque é uma ação decisiva de Deus, porque é o próprio Deus presente no mundo. E eis o que diz esta palavra: “MUNDO, EU TE AMO!” (K. Rahner)]
Vivemos na era das comunicações: boletins de notícias quase que instantaneamente nos sites de imprensa e redes sociais. Tantos, que se acumulam, sem tempo para digeri-las. Fala-se de uma “infodemia” que a OMS define da seguinte forma:
“É uma quantidade excessiva de informações -em alguns casos corretas, em outros não- que dificulta que as pessoas encontrem fontes confiáveis e orientações confiáveis quando precisam.”
- Eles nos “comunicam” informações falsas, ou “manchetes” que tentam desviar a atenção de outras realmente mais importantes. Ou nos distraem com a vida de atores, atletas e celebridades com seus amores, desgostos e traições… o que realmente não deveria nos importar nada… mas eles favorecem o que tanto gostamos: FOFOCA. Surpreende-me que “certas” noticias tenham tal audiência.
- Qualquer um pode perceber a invasão das “ofertas” do século “por pouquíssimos dias” (e não só nestes dias de Natal). Eles insistem até na satisfação nos “presentes” para os outros ou para ti mesmo… como se “todos” pudessem comprá-los. Mas aqueles que “não podem” não são vistos, “não existem”.
- Quando se atende às nossas Instituições Democráticas e representantes políticos… fica-se espantado (para dizer o mínimo), porque o que deveria ser uma escola de diálogo entre critérios e opiniões “diferentes” está repleto de agressividade, insultos, ataques pessoais a honra dos adversários, desqualificações… sem esquecer os embustes e manipulações do que deveriam ser dados objetivos e demonstráveis, ou propostas, etc. E as palavras ditas (promessas, compromissos, objetivos, projetos)… são deixadas de lado ou contrariadas pelos fatos… sem nenhum pudor. Como é cansativo…
- As palavras descrevem a vida, e são seu eco e correia de transmissão. Hoje em dia a palavra do ano é “ESCOLHIDA“. Entre os candidatos estão: apocalipse, criptomoeda, diversidade, ecocídio, gasoduto, gigafábrica, gripe, inflação, inteligência artificial, doping sexual, colisão, ucraniano, bloqueio, inflação, guerra…
- Ora, no meio de todo este emaranhado de palavras (não necessariamente negativas, felizmente), o Evangelho do Natal fala-nos da PALAVRA. Saverio Corradino escreve:
A palavra é vida e dá vida. Quando uma mãe dá à luz a seu filho, ela lhe dá um grande presente, mas quando o ensina a dizer as primeiras palavras, ela lhe dá uma segunda vida, tão importante quanto a primeira, e talvez ainda mais incrível. A mãe ajuda a fazer nascer na criança o pensamento, a desenvolver a sua inteligência e a sua criatividade, para que nela surjam os primeiros sinais de afeto: amando o seu filho, o ensina a amar. A PALAVRA torna a criança uma pessoa capaz de se comunicar e se relacionar com os outros.
Por isso Deus quis se tornar o Verbo encarnado em nossa história. Como uma mãe, pretende nos ensinar a “falar” de outra maneira. Em suma, SER DE OUTRA MANEIRA.
Os autores sagrados, os anjos, os sacerdotes e os profetas gritaram para nos fazer ouvir uma palavra diferente, uma Palavra que vem de Deus, uma Palavra que é luz no meio da escuridão de tantas palavras, e que exige um pouco de silêncio para ser ouvida Queremos ouvir e não podemos. O que terá que ser feito para alcançar aquele silêncio onde a Palavra possa ressoar, falar conosco?
- Em primeiro lugar temos que nos desintoxicar de tantas palavras que temos cravadas na cabeça e no coração, que nos chegam do campo da publicidade e do consumo: usar, gastar, comprar, jogar fora, assim é melhor, isto é novo, isto é ecológico, biodegradável ou sem conservantes, ligue já para este número e terá em casa em poucos dias… Com todas estas palavras reverberando em nossa cabeça e condicionando as nossas vidas… Deus dificilmente se deixa ouvir.
- Então teremos que nos livrar de tantas palavras superficiais ou desnecessárias que escapam de nossas bocas e corações. Não pode ser que pessoas que fazem parte de uma mesma família falem tanta bobagem, discutam coisas secundárias, e não possam (ou não querem ou não sabem como, ou não pretendem…) falar de suas preocupações, de suas ilusões, de seus sonhos, de seus sentimentos, sobre o que preenche seus corações ou os deixa vazio… As feridas que carregamos e que estão sem cicatrizar, disfarçadas com um curativo, quando o que elas precisam é de ar puro, oxigênio, diálogo, perdão…
- O mesmo deve ser dito sobre os amigos (as): Além de falar sobre o habitual, alguns dias falarão sobre como podemos nos ajudar a ser um pouco mais felizes? Vamos compartilhar nossos problemas? Saberemos ouvir os problemas dos outros tentando entendê-los e agir de acordo com eles? Seremos capazes de parar de fingir? Podemos deixar de ter que esconder tantas coisas de nós mesmos, por medo de ficarmos sozinhos. (Já não estamos sozinhos?). E em nossas comunidades religiosas e paroquiais, deixaremos de lado tantas fofocas e minúcias e aprenderemos a compartilhar mais nossa fé, nossa oração e os desafios evangelizadores que estão bem debaixo de nossos narizes?
- E finalmente teremos que nos livrar de tantas outras palavras que nos prendem com a marcha da vida: dúvidas, suspeitas, aparências, preconceitos, máscaras, saber tudo, o “já nos conhecemos”, o “o que você pode esperar de tal pessoa”, as palavras usadas como dardos envenenados…
Esta tarefa não é fácil. Mais do que tudo, porque nem nos propomos. E o próprio Deus, cansado de tanta “confusão linguística“, envergonhado por aquela Torre de Babel que construímos para subir sabe-se lá para onde… resolveu esclarecer as coisas, E A PALAVRA SE FEZ CARNE E HABITOU ENTRE NÓS (Jo 1, 14).
Veio dizer-nos palavras novas: AMOR (este, sobretudo), misericórdia, acolhimento, encontro, fraternidade, perdão, escuta, solidariedade, comunhão… Propõe um vocabulário que nos torna mais gente, à sua imagem e semelhança. E quantos são capazes de acolher e fazer sua aquela PALAVRA que nos visita, «capazes de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1, 12). Vocês já sabem quais são as palavras de Deus… devem ser ouvidas e pronunciadas por todos e cada um de nós. É significativo que Maria, depois de acolher a Palavra do Anjo… pronunciou a primeira PALAVRA do Pai na Escritura: “FAÇA-SE“. Hoje propõem o mesmo para nós.
Feliz Natal do Senhor, para todos.
Texto: Quique Martínez de la Lama-Noriega, cmf
Fonte: MISSIONÁRIOS CLARETIANOS (CIUDAD REDONDA)