A liturgia deste domingo procura definir o caminho para encontrar a vida eterna. É no amor a Deus e aos outros – dizem os textos que nos são propostos – que encontramos a vida em plenitude.
O Evangelho (Lc 10,25-37) sugere que essa vida plena não está no cumprimento de determinados ritos, mas no amor (a Deus e aos irmãos). Como exemplo, apresenta-se a figura de um samaritano – um herege, um infiel, segundo os padrões judaicos, mas que é capaz de deixar tudo para estender a mão a um irmão caído na berma da estrada. “VAI E FAZ O MESMO” – diz Jesus a cada um dos que o querem seguir no caminho da vida plena.
A primeira leitura (Dt 30,10-14) reflete, sobretudo, sobre a questão do amor a Deus. Convida os crentes a fazer de Deus o centro da sua vida e a amá-lo de todo o coração. Como? Escutando a sua voz no íntimo do coração e percorrendo o caminho dos seus mandamentos.
Na segunda leitura (Cl 1,15-20), Paulo apresenta-nos um hino que propõe Cristo como a referência fundamental, como o centro à volta do qual se constrói a história e a vida de cada crente. O texto foge, um tanto, à temática geral das outras duas leituras; no entanto, a catequese sobre a centralidade de Cristo leva-nos a pensar na importância do que Ele nos diz no Evangelho de hoje. Se Cristo é o centro a partir do qual tudo se constrói, convém escutá-l’O atentamente e fazer do amor a Deus e aos outros uma exigência fundamental da nossa caminhada.
Leituras
O convite a aderir com todo o coração e com todo o ser às propostas de Deus leva-nos a questionar a qualidade da nossa adesão. Não pode ser uma adesão a “meia-boca” ou parcialmente – de acordo com os nossos interesses; mas tem de ser uma adesão total, completa, plenamente empenhada, a “fundo perdido”. É desta forma radical e total que aderimos aos projetos de Deus, ou a nossa adesão é “morna”,
incompleta, limitada, reticente?
que estão escritos nesta lei.
Converte-te para o Senhor teu Deus
com todo o teu coração e com toda a tua alma.
nem está fora do teu alcance.
‘Quem subirá ao céu por nós para apanhá-lo?
Quem no-lo ensinará para que o possamos cumprir?’
‘Quem atravessará o mar por nós para apanhá-lo?
Quem no-lo ensinará para que o possamos cumprir?’
está em tua boca e em teu coração,
para que a possas cumprir.
Palavra do Senhor.
R. Humildes, buscai a Deus e alegrai-vos:
o vosso coração reviverá!
14 Por isso elevo para vós minha oração, *
neste tempo favorável, Senhor Deus!
Respondei-me pelo vosso imenso amor, *
pela vossa salvação que nunca falha!
17 Senhor, ouvi-me pois suave é vossa graça, *
ponde os olhos sobre mim com grande amor! R.
e não despreza o clamor de seus cativos. R.
b reconstruindo as cidades de Judá.
dentro delas fixarão sua morada! R.
Pode acontecer que os nossos interesses egoístas, as nossas ambições, as nossas paixões, os nossos esquemas e projetos pessoais abafem a voz de Deus e nos impeçam de escutar as suas propostas. Quais são, para mim, essas outras “vozes” que calam a voz de Deus? Que lugar essas “vozes” ocupam na minha vida? Em que medida elas contribuem para definir o sentido essencial da minha existência?
as visíveis e as invisíveis,
tronos e dominações, soberanias e poderes.
Tudo foi criado por meio dele e para ele.
de sorte que em tudo ele tem a primazia,
realizando a paz pelo sangue da sua cruz.
Palavra do Senhor.
A pergunta do mestre da Lei não é uma pergunta acadêmica; é a pergunta que fazemos todos os dias: “O que fazer para chegar à vida plena, à felicidade? como dar, verdadeiramente, sentido à vida?”, a resposta eterna é: “faz de Deus o centro da tua vida, ama-o e ama também os outros irmãos”. Trata-se, portanto, de fazer com que o amor percorra as duas coordenadas fundamentais da nossa existência – a vertical (relação com Deus) e a horizontal (relação com os outros homens).
É por aqui que passa a nossa realização plena.
“Mestre, que devo fazer
para receber em herança a vida eterna?”
Como lês?”
de todo o teu coração e com toda a tua alma,
com toda a tua força e com toda a tua inteligência;
e ao teu próximo como a ti mesmo!”
Faze isso e viverás”.
29 Ele, porém, querendo justificar-se,
e caiu nas mãos de assaltantes.
Estes arrancaram-lhe tudo, espancaram-no,
e foram-se embora deixando-o quase morto.
Quando viu o homem,
e seguiu adiante, pelo outro lado.
Depois colocou o homem em seu próprio animal
e levou-o a uma pensão, onde cuidou dele.
“Toma conta dele!
Quando eu voltar,
vou pagar o que tiveres gasto a mais”.
E Jesus perguntou:
Então Jesus lhe disse:
Palavra da Salvação.
Fonte: Liturgia Diária – CNBB
Reflexão
OLHAR, APROXIMAR-SE E AJUDAR.
Já passou para o acervo de nosso idioma. Não sabemos sequer se existiu o “samaritano” da parábola. Mas hoje se chama “BOM SAMARITANO” a qualquer pessoa de bom coração que ajuda a seus irmãos sem pedir nada em troca. Não há melhor coisa que se encontrar um bom samaritano quando se anda perdido pelos caminhos da vida, sem rumo e talvez ferido e espancado. Até é possível que nos surpreenda sua generosidade sem limite, o carinho gratuito que recebemos, tão acostumados como estamos a pagar por tudo o que recebemos.
Mas a parábola de Jesus vai para além. Porque o samaritano não é só um que parou para atender àquele homem abandonado e ferido ao lado do caminho. Em sua parábola, Jesus põe em relação ao samaritano outras personagens bem conhecidas do povo judeu: um sacerdote e um levita. Os dois são representantes da religião oficial judia. Os dois pregam no templo e são mediadores entre Deus e os homens. Sacerdotes e levitas supõe-se que tenham um acesso a Deus do qual carecem o resto dos crentes ”o mesmo que hoje muitos cristãos pensam ainda de sacerdotes e religiosos”. O samaritano, desde a perspectiva judia, pertencia praticamente ao extremo oposto da escala religiosa. Era um povo que tinha misturado a religião judia com outras crenças estranhas. Era traidor da fé autêntica, um povo impuro. Os judeus tratavam de evitar todo contato com os samaritanos. O contato com um samaritano fazia com que o judeu se voltasse ao impuro.
Por isso, tem mais peso o fato de que Jesus contraponha na parábola aos representantes oficiais da religião, um sacerdote e um levita, com um samaritano, pecador e impuro. E, o que é pior, que seja precisamente o samaritano o que sai em socorro ao homem abandonado, comportando-se como Deus quer, o que é capaz de se aproximar ao próximo desabrigado e abandonado. Dito de outra maneira, o que se faz próximo de seu irmão necessitado.
Na realidade, Jesus está repensando nossa relação com Deus. Bem mais importante que o culto oficial e litúrgico do templo, é a proximidade ao irmão necessitado. Bem mais valioso que oferecer sacrifícios e orações, é adorar a deus no irmão ou irmã que sofrem pela razão que seja. Jesus não é sacerdote mais profeta. Jesus afasta-se do templo e convida-nos a viver nossa relação com Deus no encontro diário, habitual, na rua, com nossos irmãos e irmãs. Aí é onde se joga nossa relação com Deus. E somos capazes de amar assim, poderemos dizer que amamos a Deus. Porque, como diz João, o que diz que ama a Deus e não ama a seu irmão, é um mentiroso. Nem mais nem menos.
Reflitamos os textos deste domingo respondendo as seguintes questões:
- O mandamento de Deus está ao nosso alcance como o estão nossos irmãos e irmãs. Acerco-me a eles e me interesso para valer por eles?
- Os acompanho em suas necessidades? Sou capaz de escutar? Sou um “bom samaritano”?
Texto: Quique Martínez de la Lama-Noriega, cmf
Fonte: Ciudad Redonda