Jesus nos convida a seguir o caminho dos seus mandamentos, pois ao nosso alcance estão o bem e o mal, a felicidade e a infelicidade. A liturgia do VI Domingo do Tempo Comum garante-nos que Deus tem um projeto de salvação para que o homem possa chegar à vida plena e propõe-nos uma reflexão sobre a atitude que devemos assumir diante desse projeto.
Na segunda leitura (1Cor 2,6-10), Paulo apresenta o projeto salvador de Deus (aquilo que ele chama “sabedoria de Deus” ou “o MISTÉRIO”). É um projeto que Deus preparou desde sempre “para aqueles que o amam”, que esteve oculto aos olhos dos homens, mas que Jesus Cristo revelou com a sua pessoa, as suas palavras, os seus gestos e, sobretudo, com a sua morte na cruz (pois aí, no dom total da vida, revelou-se aos homens a medida do amor de Deus e mostrou-se ao homem o caminho que leva à realização plena). São Paulo afirma que o Evangelho é sabedoria revelada aos “perfeitos”, isto é, às pessoas dóceis ao Espírito. As contendas da comunidade do Corinto podem impedir a compreensão da sabedoria de Deus. Os poderosos deste mundo são incapazes de compreender essa sabedoria, pois se a tivessem compreendido, não teriam crucificado o autor dela.
A primeira leitura (Eclo 15,16-21) recorda, no entanto, que o homem é livre para escolher entre a proposta de Deus (que conduz à vida e à felicidade) e a autossuficiência do próprio homem (que conduz, quase sempre, à morte e à desgraça). Para ajudar o homem que escolhe a vida, Deus propõe “mandamentos”: são os “sinais” com que Deus delimita o caminho que conduz à salvação. Conforme a primeira leitura, Deus, em sua sabedoria, não mandou ninguém agir com impiedade nem deu licença para pecar. No entanto, deixou o homem livre. Como diante da água e do fogo, a pessoa pode escolher onde pousar a mão, assim pode preferir a morte ou a vida, o bem ou o mal. A vida consiste em confiar em Deus e observar seus mandamentos para ser guardados/preservados.
O Evangelho (Mt 5,17-37) completa a reflexão, propondo a atitude de base com que o homem deve abordar esse caminho balizado pelos “mandamentos”: não se trata apenas de cumprir regras externas, no respeito estrito pela letra da lei, mas trata-se de assumir uma verdadeira atitude interior de adesão a Deus e às suas propostas, que tenha, depois, correspondência em todos os passos da vida. Contemplamos, hoje, as quatro primeiras antíteses do Sermão da Montanha. Jesus ensina a superar a justiça farisaica. Esta consistia em se prender nos mínimos detalhes à Lei mosaica e às tradições humanas transmitidas pelos antepassados. Jesus ensina e exorta a uma justiça maior. Fazer e observar a vontade de Deus – justiça – é não matar fisicamente, mas também não matar pela ira. A vontade de Deus é a paz e a reconciliação constante entre os irmãos. Fazer e observar a vontade de Deus é não cometer adultério, nem no sentido estrito e próprio da palavra, nem no coração com desejos maliciosos. Para isso, o discípulo fiel evita toda circunstância e motivo de pecado: arranca a mão e o olho, isto é, tira do alcance do coração, toda ocasião de pecado e perdição. Jesus ensina, ainda, sobre o divórcio, que pode levar ao adultério e, por fim, exorta à sinceridade. “Seja o vosso ‘sim’: SIM”, e o vosso ‘não’: NÃO”. Tudo o que for além disso vem do Maligno!
A insistência de Jesus na defesa da vivência das Escrituras (Mt 5,17-37), ou seja, da Lei, exprime que, em vez da obsessão por “mandamento”, a verdadeira religião se pauta na felicidade (bem-aventuranças), toca a existência e não se fecha em um emaranhado de regras e imposições, distantes da relação com a vida. A verdadeira religião humaniza e santifica.
Jesus não relativiza a Lei, mas a aperfeiçoa no mais alto grau, fazendo o bem, compadecendo-se, restituindo a dignidade dos fragilizados e caídos à beira do caminho. Ele ofereceu o sabor do céu aos que, neste mundo, são obrigados a experimentar o amargor do inferno. Jesus combateu todo tipo de escravidão e sujeição. Jesus cumpriu a Lei de maneira radical. Quando ele fala aos discípulos o “AMAI-VOS” (Jo 13,34), esse ensinamento tem autoridade, porque Jesus é o próprio amor.
Para o Mestre Jesus, uma fé autêntica não compactua com uma religião de fachada. A verdadeira espiritualidade evita e combate a cultura do ódio, os discursos e práticas ofensivas, o preconceito, superando assim a justiça dos fariseus de nosso tempo! A verdadeira lei é o amor: amar a Deus e ao próximo como a si mesmo!
Texto: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
Imagem: PIXABAY
Fonte: CNBB