A liturgia deste XII Domingo coloca no centro da nossa reflexão a figura de Jesus: quem é Ele e qual o impacto que a sua proposta de vida tem em nós? A Palavra de Deus que nos é proposta impele-nos a descobrir em Jesus o “MESSIAS” de Deus, que realiza a libertação dos homens através do amor e do dom da vida; e convida cada “cristão” à identificação com Cristo – isto é, a “TOMAR A CRUZ”, a fazer da própria vida um dom generoso aos outros.
O Evangelho (Lc 9,18-24) confronta-nos com a pergunta de Jesus: “e vós, quem dizeis que Eu sou?” Paralelamente, apresenta o caminho messiânico de Jesus, não como um caminho de glória e de triunfos humanos, mas como um caminho de amor e de cruz. “CONHECER JESUS” é aderir a Ele e segui-l’O nesse caminho de entrega, de doação, de amor total.
A primeira leitura (Zc 12,10-11.13,1) apresenta-nos um misterioso profeta “trespassado”, cuja entrega trouxe conversão e purificação para os seus concidadãos. Revela, pois, que o caminho da entrega não é um caminho de fracasso, mas um caminho que gera vida nova para nós e para os outros. João, o autor do Quarto Evangelho, identificará essa misteriosa figura profética com o próprio Cristo.
A segunda leitura (Gl 3,26-29) reforça a mensagem geral da liturgia deste domingo, insistindo que o cristão deve “revestir-se” de Jesus, renunciar ao egoísmo e ao orgulho e percorrer o caminho do amor e do dom da vida. Esse caminho faz dos crentes uma única família de irmãos, iguais em dignidade e herdeiros da vida em plenitude.
Leituras
Esta figura do “trespassado” faz-nos pensar em todos os “profetas” que lutam pela justiça e pela verdade e que são torturados, vilipendiados, massacrados por causa do seu testemunho incômodo. A identificação do “trespassado” com o próprio Deus diz-nos que o profeta nunca está só e perdido face ao ódio do mundo, mas que Deus está sempre do seu lado; diz-nos, também, que é de Deus que brota a missão profética, mesmo quando ela incomoda e questiona os homens.
um espírito de graça e de oração;
eles olharão para mim.
Ao que eles feriram de morte,
hão de chorá-lo,
como se chora a perda de um filho único,
e hão de sentir por ele a dor
que se sente pela morte de um primogênito.
à casa de Davi e aos habitantes de Jerusalém,
para ablução e purificação”.
Palavra do Senhor.
R. A minh’alma tem sede de vós,
como a terra sedenta, ó meu Deus!
2a Sois vós, ó Senhor, o meu Deus! *
b Desde a aurora ansioso vos busco!
c A minh’alma tem sede de vós, *
d minha carne também vos deseja. R.
2e Como terra sedenta e sem água, †
3 venho, assim, contemplar-vos no templo, *
para ver vossa glória e poder.
4 Vosso amor vale mais do que a vida: *
e por isso meus lábios vos louvam. R.
5 Quero, pois vos louvar pela vida, *
e elevar para vós minhas mãos!
6 A minh’alma será saciada, *
como em grande banquete de festa;
cantará a alegria em meus lábios, *
ao cantar para vós meu louvor! R.
8 Para mim fostes sempre um socorro; *
de vossas asas á sombra eu exulto!
9 Minha alma se agarra em vós; *
com poder vossa mão me sustenta. R.
O cristão é, fundamentalmente, aquele que se “revestiu de Cristo”. Que significa isto, concretamente? Que assinamos um documento no qual nos comprometemos a viver como batizados? Que nos comprometemos somente a ir à missa ao domingo? Ou significa que assumimos o compromisso de viver como Cristo, de assumir os seus valores, de fazer da nossa vida um dom de amor, de nos entregarmos até à morte para construir
um mundo de justiça e de paz para todos?
nem homem nem mulher,
pois todos vós sois um só, em Jesus Cristo.
Palavra do Senhor.
Quem é Jesus, para nós? É alguém que conhecemos das fórmulas do catecismo ou dos livros de teologia, sobre quem sabemos dizer coisas que aprendemos nos livros? Ou é alguém que está no centro da nossa existência, cujo “caminho” tem um real impacto no nosso dia a dia, cuja vida circula em nós e nos transforma, com quem dialogamos, com quem nos identificamos e a quem amamos?
Então Jesus perguntou-lhes:
“Quem diz o povo que eu sou?”
outros, que és Elias;
que és algum dos antigos profetas que ressuscitou”.
Pedro respondeu:
ser rejeitado pelos anciãos,
pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei,
deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia”.
tome sua cruz cada dia, e siga-me.
esse a salvará”.
Palavra da Salvação.
Fonte: Liturgia Diária – CNBB
Reflexão
E VÓS, QUEM DIZEIS QUE EU SOU?
Comecemos por parafrasear algumas das ideias de Hans Küng sobre o que é a fé cristã, que é o tema do Evangelho deste domingo. A fé cristã não abraça tudo o que é verdadeiro, bom, belo e humano. Ninguém o pode negar: mesmo fora da fé cristã há verdade, bondade, beleza e humanidade. No entanto, só é legítimo chamar à fé cristã tudo aquilo que, em teoria e na prática, tem uma relação positiva e expressiva com Jesus Cristo. Nem todos os homens de verdadeira convicção, fé sincera e boa vontade têm fé cristã. Ninguém pode esquecer que mesmo fora da fé cristã há convicção verdadeira, fé sincera e boa vontade. Por outro lado, é legítimo chamar a todos aqueles cuja vida e morte é, em última análise, determinada por Cristo, um homem de fé cristã.
Nem todos os grupos de meditação ou ação, todas as comunidades de pessoas empenhadas que, para serem salvas, tentam levar uma vida honesta, são uma Igreja Cristã. Isto nunca deveria ter ficado em dúvida: mesmo noutros grupos fora da Igreja há empenho, ação, meditação, honestidade de vida e salvação. Por outro lado, é legítimo chamar a todas as comunidades, grandes ou pequenas, de pessoas para quem só Jesus Cristo é o determinante, como Igreja Cristã. Não há fé cristã em toda a parte onde a desumanidade é combatida e a humanidade é realizada. É uma verdade manifesta que fora do cristianismo (entre judeus, muçulmanos, hindus e budistas, entre humanistas e ateus declarados…) a desumanidade é combatida e a humanidade é promovida. Contudo, não há fé cristã, exceto onde, em teoria e na prática, a memória de Jesus Cristo é ativada.
A fé cristã e o cristão não se distinguem dos outros pelas obras externas que realizam, mas pela sua interioridade: pela fé em Jesus de Nazaré. Isto é o que é específico do cristianismo, o que é específico da fé. A crença em Jesus é o centro da fé, ele tem-nos proclamado repetidamente que os pequenos são os favoritos do Pai, que o Reino de Deus pertence aos pobres. No evangelho de Mateus temos: Todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes. É por isso que a Caridade verifica a fé, estando ao lado do Crucificado e do crucificado da história, fala do Deus em quem acreditamos e da nossa crença no Deus de Jesus, na esperança, na sua ressurreição: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser executado, e ao terceiro dia ressuscitar“.
A fé não se opõe a nada, é a experiência de seguir Cristo e para Jesus Cristo, o definitivo, o decisivo é estar com aqueles que sofrem: aproximar-se dos doentes, tocar a pele dos leprosos, abraçar as crianças, comer com os pecadores e os excluídos, estar com os indesejáveis: prostitutas, adúlteros… A Fé é amor, (caridade), descobrir no rosto dos pobres, o rosto de Deus, não há nada mais verdadeiramente humano: a pessoa, a razão, a cultura, a ciência, a política, a justiça, o mundo…; isso não nos interessa e afeta. Mas Jesus perguntou:
“E vós, quem dizeis que eu sou?” Pedro respondeu: “O Cristo de Deus”. Mas Jesus proibiu-lhes severamente que contassem isso a alguém.
A fé cristã sempre esteve em guarda, tanto contra aqueles que confessam um Jesus divino que brinca de ser humano, como contra aqueles que veem nele um grande homem, cujo único aspecto divino é o que nele colocamos. Jesus é o Messias, mas um Messias sofredor. O caminho do discipulado leva a descobri-lo como o Filho de Deus, mas não evita entrar na dificuldade de carregar a cruz:
“Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará“.
Não é cristão quem apenas vê Jesus como uma boa pessoa, mas também não é aquele que procura um Jesus Messias que se inclina pelo mundo, sem ser manchado pela história. O resto é inventar outra fé, outro Deus, outra Igreja, que existe, mas não é o seguimento de Jesus. A fé é a proclamação da Boa Nova, um encontro, o que nos faz humildemente formar uma comunidade. A nossa fé não nos torna melhores ou piores, a fé é uma experiência, é vestir Cristo, como São Paulo nos diz na segunda leitura. Esta é a confissão de Pedro e nossa.
Texto: Julio César Rioja, cmf
Fonte: Ciudad Redonda