
No dia 29 de junho, a Igreja não apenas recorda, mas celebra dois gigantes da fé: São Pedro e São Paulo. Dois homens, duas histórias radicalmente diferentes, um mesmo amor que os consumiu até o fim. Um era um pescador rude, de mãos calejadas pelas redes; o outro, um intelectual fervoroso, respirava as Escrituras e perseguia os seguidores do Nazareno. E, no entanto, ambos ouviram o mesmo chamado – um à beira do mar, outro no poeirento caminho de Damasco – e responderam com uma entrega tão total que mudou o curso da história.
Pedro, o impulsivo, aquele que afundou nas águas por duvidar, que negou Jesus três vezes, mas cujo arrependimento foi tão ardente quanto suas lágrimas. Paulo, o perseguidor, cujo zelo religioso se transformou em fogo missionário após um encontro que o deixou cego – só para enxergar, pela primeira vez, a verdadeira luz. Dois pecadores. Dois santos. Dois mártires que selaram seu testemunho com o próprio sangue em Roma, sob a tirania de Nero.
O QUE OS UNE? Não foi apenas a morte, mas a vida dada sem reservas. O Evangelho deste dia nos lança uma pergunta incômoda: “E para você, quem é Jesus?“ Pedro respondeu sem hesitar: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo“ (Mt 16,16). Essa confissão não nasceu de um raciocínio teológico impecável, mas de um coração que, apesar de todas as quedas, reconheceu Aquele que era maior que seus medos. E sobre essa fé – trêmula, humana, mas autêntica – Cristo edificou sua Igreja.
A Primeira Leitura (At 12,1-11) nos mostra um Pedro milagrosamente libertado das correntes, um anjo despertando-o no escuro da prisão. Quantas vezes nós também estamos algemados – pelo medo, pela rotina, pela desilusão – e não percebemos que Deus está ali, sacudindo nosso sono, dizendo: “Levanta-te depressa!“ A libertação de Pedro não foi apenas um evento sobrenatural; foi um sinal de que, mesmo quando o mundo fecha suas portas, Deus abre caminhos onde não há saída.
Já Paulo, na Segunda Leitura (2Tm 4,6-8), escreve o que parece um testamento espiritual: “Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé“. Há uma urgência nessas palavras, uma consciência de que o tempo é curto e o essencial é incontornável. Paulo não fala de triunfos humanos, mas de fidelidade. Ele, que outrora prendia cristãos, agora se alegra em ser prisioneiro de Cristo. Que contraste com nossa era, onde muitos trocam o Evangelho por aplausos efêmeros!
E NÓS? Pedro nos desafia a crer mesmo quando fraquejamos. Paulo nos convoca a não negociar a fé, mesmo quando o mundo nos chama de radicais. Ambos nos lembram que o cristianismo não é uma filosofia confortável, mas um amor que exige tudo – até a cruz.
Hoje, a Igreja não precisa de heróis perfeitos, mas de homens e mulheres que, como Pedro e Paulo, ousem dizer “sim” sem calcular riscos. Que sua solenidade não seja apenas uma memória, mas um chamado: De que lado da história você está?
Leituras
Assim como Pedro, acorrentado e sem esperança, exclamou: ‘Agora sei que o Senhor enviou o seu anjo para me libertar do poder de Herodes‘, também nós, em meio às prisões invisíveis de hoje, podemos crer: Deus rompe grilhões quando tudo parece perdido.
Eram os dias dos Pães ázimos.
guardado por quatro grupos de soldados,
com quatro soldados cada um.
Herodes tinha a intenção de apresentá-lo ao povo,
depois da festa da Páscoa.
Pedro dormia entre dois soldados,
preso com duas correntes;
e os guardas vigiavam a porta da prisão.
O anjo tocou o ombro de Pedro, acordou-o e disse:
“Levanta-te depressa!”
As correntes caíram-lhe das mãos.
Pedro obedeceu e o anjo lhe disse:
“Põe tua capa e vem comigo!”
pois pensava que aquilo era uma visão.
O portão abriu-se sozinho.
Eles saíram, caminharam por uma rua
e logo depois o anjo o deixou.
para me libertar do poder de Herodes
e de tudo o que o povo judeu esperava!”
Palavra do Senhor.
Como o salmista que gritou ‘De todos os temores me livrou o Senhor Deus!‘, nós, assombrados pelas angústias deste tempo, podemos provar que Ele ainda desfaz cadeias e nos envolve em sua luz libertadora.
R. De todos os temores me livrou o Senhor Deus.
2 Bendirei o Senhor Deus em todo o tempo, *
seu louvor estará sempre em minha boca.
3 Minha alma se gloria no Senhor; *
que ouçam os humildes e se alegrem! R.
4 Comigo engrandecei ao Senhor Deus, *
exaltemos todos juntos o seu nome!
5 Todas as vezes que o busquei, ele me ouviu, *
e de todos os temores me livrou. R.
6 Contemplai a sua face e alegrai-vos, *
e vosso rosto não se cubra de vergonha!
7 Este infeliz gritou a Deus, e foi ouvido, *
e o Senhor o libertou de toda angústia. R.
8 O anjo do Senhor vem acampar *
ao redor dos que o temem, e os salva.
9 Provai e vede quão suave é o Senhor! *
Feliz o homem que tem nele o seu refúgio! R.
Como Paulo, que na hora derradeira exclamou ‘Agora está reservada para mim a coroa da justiça‘, nós, em meio às nossas batalhas diárias, podemos seguir lutando, certos de que em Cristo até o cansaço se transforma em glória eterna.
aproxima-se o momento de minha partida.
e não somente a mim,
mas também a todos que esperam com amor
a sua manifestação gloriosa.
fosse anunciada por mim integralmente,
e ouvida por todas as nações;
e eu fui libertado da boca do leão.
A ele a glória, pelos séculos dos séculos! Amém.
Palavra do Senhor.
Quando Jesus declarou ‘Tu és Pedro e eu te darei as chaves do Reino dos Céus’, não fundou uma instituição de poder, mas uma comunidade de perdão – onde até as portas do inferno tremem diante de um amor que liberta.
“Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?”
Outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”.
porque não foi um ser humano que te revelou isso,
mas o meu Pai que está no céu.
e o poder do inferno nunca poderá vencê-la.
tudo o que tu desligares na terra
será desligado nos céus”.
Palavra da Salvação.
Homilia
AS COLUNAS: PEDRO E PAULO


Hoje celebramos, com o coração em festa, dois personagens singulares na origem da Igreja: Simão Pedro e Saulo de Tarso. Dois homens profundamente diferentes, mas unidos por um mesmo chamado, uma mesma graça e uma mesma missão.
Convido você a caminhar comigo nesta reflexão, que se desdobra em quatro partes, como quem percorre os degraus de uma escada que leva ao céu:
- Pedro: a rocha e a fragilidade.
- Paulo: o raio e a razão.
- A dança dos contrastes e a unidade de um só Evangelho.
- Rumo a um novo amanhecer.
Que este encontro com a vida, o testemunho e a fé desses dois gigantes do Cristianismo acenda em nossos corações uma luz capaz de iluminar os desafios, as incertezas e as esperanças dos nossos dias.
PEDRO: A ROCHA E A FRAGILIDADE
Sua fé foi impetuosa, ardente, quase intempestiva. Caminhou sobre as águas… e, no entanto, começou a afundar – “Senhor, salva-me!” (Mateus 14,28-31). Proclamou com força e convicção: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mateus 16,16), mas também, na noite sombria do Getsêmani, o negou por três vezes (João 18,15-27).
Jesus o chamou de “ROCHA” – uma pedra escolhida, mas, ao mesmo tempo, uma rocha que tremia. E, apesar de suas fraquezas, sobre ela Ele edificou a sua Igreja.
Mesmo depois da traição, o Senhor não lhe retirou o olhar, nem o amor. Pelo contrário, interrogou-lhe o coração: “Simão, filho de João, tu me amas?” – e, na resposta amorosa, confiou-lhe novamente a missão de ser pastor (João 21,15-17).
Em Pedro, a autoridade pastoral não se veste de perfeição, mas se reveste da humanidade redimida. É nele que se encarna o testemunho fiel de Jesus, não como poder dominador, mas como serviço que nasce da fragilidade abraçada e transfigurada pelo amor.
PAULO: O RAIO E A RAZÃO
Antes de ser São Paulo, ele era Saulo – um fariseu de sangue quente e convicções inflexíveis. Seu zelo não era mero fanatismo religioso, mas um fogo que consumia sua própria humanidade. Mas bastou um único clarão, uma luz fulgurante que o derrubou do orgulho e do caminho errado: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” (Atos 9,4).
O perseguidor tornou-se, então, o grande Apóstolo dos Gentios. Sua vida se converteu em um serviço incondicional, apaixonado e destemido ao Evangelho.
Suas palavras inflamaram o mundo: escreveu cartas ardentes que até hoje nos sacodem, fundou comunidades mesmo em meio a perigos e perseguições, e levou o anúncio de Cristo até os centros do pensamento humano, como quando discursou no Areópago: “Vejo que sois, em tudo, extremamente religiosos…” (Atos 17,22-34).
Foi um missionário incansável, um teólogo de mente aberta, capaz de dialogar com todas as culturas e de anunciar o Evangelho sem fronteiras.
Mas sua cruz não foi pequena. Carregou no corpo os sinais do sofrimento e da constante incompreensão. Sua vida inteira foi marcada pela entrega radical, como ele mesmo testemunha: “Trazemos sempre em nosso corpo os traços da morte de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nós” (2 Coríntios 4,10).
Em Paulo, contemplamos a paixão pela missão, o fogo do Espírito e a coragem de quem, uma vez transformado pelo encontro com Cristo, nunca mais voltou a ser o mesmo.
A DANÇA DOS CONTRASTES E A UNIDADE DE UM SÓ EVANGELHO.
O sucessor de Pedro, Leão XIV, é chamado a reunir em si as virtudes de Pedro e de Paulo: unir, com sabedoria e discernimento, a força da tradição, a ousadia do Espírito, a ternura da misericórdia e a abertura do diálogo.
É chamado a ser rocha, para sustentar a fé, e raio de luz, para iluminar os caminhos sombrios do nosso tempo. Sua missão é conduzir a Igreja com coragem e esperança, desbravando novas fronteiras, sem medo dos desafios que a história apresenta.
Leão XIV é convidado a ser um “Missionário Audacioso e Profeta do Encontro”. Nele deve pulsar a coragem paulina, capaz de levar o Evangelho às novas fronteiras – sejam elas existenciais, culturais ou digitais – e dialogar com o mundo, como Paulo fez no Areópago: “Vejo que sois, em tudo, muito religiosos” (Atos 17,22).
Ao mesmo tempo, precisará possuir a clareza teológica para iluminar os desafios e as feridas do nosso tempo, assim como a paixão ardente pela justiça e pela dignidade humana, que caracterizou a vida do Apóstolo dos Gentios.
É um chamado exigente e belo: ser ponte entre o ontem e o amanhã, entre a firmeza da fé e a ternura da misericórdia, entre a fidelidade ao Evangelho e a escuta sincera do clamor do mundo.
CONCLUSÃO
Pedro e Paulo. Dois caminhos, uma só fé. Dois carismas, uma só Igreja. A dança harmoniosa – e, por vezes, dialética – entre esses dois gigantes da fé é a própria alma da missão cristã.
O novo Papa é chamado a escutar esse eco que atravessa os séculos: ser rocha que não teme as ondas revoltas do mar, e raio de luz que ilumina sem ferir; ser pastor que conhece o cheiro das ovelhas, que caminha junto, que cuida, e, ao mesmo tempo, missionário capaz de atravessar desertos e fronteiras, movido unicamente pelo amor.
Que seu ministério se transforme num ponte viva, que une a firmeza de Pedro ao fogo missionário de Paulo – tudo para a glória de Deus e em serviço da humanidade.
Amém.
Texto: JOSÉ CRISTO REY GARCÍA PAREDES
Fonte: ECOLOGÍA DEL ESPÍRITU
Este artigo foi produzido com a assistência de ferramentas de inteligência artificial.