LITURGIA DA QUARTA-FEIRA DE CINZAS (ANO B)

A PALAVRA

Iniciamos hoje a Quaresma, que é tempo de escuta da Palavra, de oração, de jejum, e da prática da caridade como caminho de conversão, tendo como horizonte a celebração do Mistério Pascal de nosso Senhor Jesus Cristo, queremos com Jesus realizar nossa passagem da morte para a vida plena. Este tempo de graça e reconciliação se inicia com a celebração das Cinzas: apelo para a conversão e convite à revisão de nossas atitudes.

Durante a Quaresma, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil promove a Campanha da Fraternidade, cuja finalidade é ajudar-nos a assumir a dimensão pessoal, comunitária e social da Quaresma. Neste ano, o tema é “FRATERNIDADE E DIÁLOGO: COMPROMISSO DE AMOR”. E o lema, “CRISTO É A NOSSA PAZ: DO QUE ERA DIVIDIDO, FEZ UMA UNIDADE” Efésios (2, 14). A CF Através do diálogo amoroso e do testemunho da unidade na diversidade, inspiradas e inspirados no amor de Cristo, convidar comunidades de fé e pessoas de boa vontade para pensar, avaliar e identificar caminhos para a superação das polarizações e das violências que marcam o mundo atual. A Comissão da CFE 2021 é formada por representantes das igrejas-membro do CONIC, além da Igreja Betesda de São Paulo, como igreja observadora, e o Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e à Educação Popular (Ceseep), como membro fraterno.

Leituras

12‘Agora, diz o Senhor,
voltai para mim com todo o vosso coração,
com jejuns, lágrimas e gemidos;
13rasgai o coração, e não as vestes;
e voltai para o Senhor, vosso Deus;
ele é benigno e compassivo,
paciente e cheio de misericórdia,
inclinado a perdoar o castigo’.
14Quem sabe, se ele se volta para vós e vos perdoa,
e deixa atrás de si a bênção,
oblação e libação
para o Senhor, vosso Deus?
15Tocai trombeta em Sião,
prescrevei o jejum sagrado,
convocai a assembléia;
16congregai o povo,
realizai cerimônias de culto,
reuni anciãos,
ajuntai crianças e lactentes;
deixe o esposo seu aposento,
e a esposa, seu leito.
17Chorem, postos entre o vestíbulo e o altar,
os ministros sagrados do Senhor, e digam:
‘Perdoa, Senhor, a teu povo,
e não deixes que esta tua herança sofra infâmia
e que as nações a dominem.’
Por que se haveria de dizer entre os povos:
‘Onde está o Deus deles?’
18Então o Senhor encheu-se de zelo por sua terra
e perdoou ao seu povo.
Palavra do Senhor.
R. Misericórdia, ó Senhor, pois pecamos.


3Tende piedade, ó meu Deus, misericórdia! *
Na imensidão de vosso amor, purificai-me!
4Lavai-me todo inteiro do pecado, *
e apagai completamente a minha culpa! R.

5Eu reconheço toda a minha iniqüidade,*
o meu pecado está sempre à minha frente.
6aFoi contra vós, só contra vós, que eu pequei,*
pratiquei o que é mau aos vossos olhos! R.

12Criai em mim um coração que seja puro,*
dai-me de novo um espírito decidido.
13Ó Senhor, não me afasteis de vossa face,*
nem retireis de mim o vosso Santo Espírito! R.

14Dai-me de novo a alegria de ser salvo*
e confirmai-me com espírito generoso!
17Abri meus lábios, ó Senhor, para cantar,*
e minha boca anunciará vosso louvor! R.

Irmãos:
20Somos embaixadores de Cristo,
e é Deus mesmo que exorta através de nós.
Em nome de Cristo, nós vos suplicamos:
deixai-vos reconciliar com Deus.
21Aquele que não cometeu nenhum pecado,
Deus o fez pecado por nós,
para que nele nós nos tornemos justiça de Deus.
6,1Como colaboradores de Cristo,
nós vos exortamos a não receberdes em vão a graça de Deus,
2pois ele diz: ‘No momento favorável, eu te ouvi
e no dia da salvação, eu te socorri’.
É agora o momento favorável,
é agora o dia da salvação.
Palavra do Senhor.

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos:
1‘Ficai atentos
para não praticar a vossa justiça na frente dos homens,
só para serdes vistos por eles.
Caso contrário, não recebereis a recompensa
do vosso Pai que está nos céus.
2Por isso, quando deres esmola,
não toques a trombeta diante de ti,
como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas,
para serem elogiados pelos homens.
Em verdade vos digo:
eles já receberam a sua recompensa.
3Ao contrário, quando deres esmola,
que a tua mão esquerda não saiba
o que faz a tua mão direita,
4de modo que, a tua esmola fique oculta.
E o teu Pai, que vê o que está oculto,
te dará a recompensa.
5Quando orardes,
não sejais como os hipócritas,
que gostam de rezar em pé,
nas sinagogas e nas esquinas das praças,
para serem vistos pelos homens.
Em verdade vos digo:
eles já receberam a sua recompensa.
6Ao contrário, quando tu orares,
entra no teu quarto, fecha a porta,
e reza ao teu Pai que está oculto.
E o teu Pai, que vê o que está escondido,
te dará a recompensa.
16Quando jejuardes,
não fiqueis com o rosto triste como os hipócritas.
Eles desfiguram o rosto,
para que os homens vejam que estão jejuando.
Em verdade vos digo:
Eles já receberam a sua recompensa.
17Tu, porém, quando jejuares,
perfuma a cabeça e lava o rosto,
18para que os homens não vejam
que tu estás jejuando,
mas somente teu Pai, que está oculto.
E o teu Pai, que vê o que está escondido,
te dará a recompensa.
Palavra da Salvação.

Reflexão

VOLTAI PARA MIM COM TODO O VOSSO CORAÇÃO

Como povo de Deus, começamos o caminho da Quaresma, tempo em que procuramos unir-nos mais intimamente ao Senhor, para compartilhar o mistério da sua paixão e da sua ressurreição.

A liturgia de hoje propõe-nos antes de tudo o trecho do profeta Joel, enviado por Deus para chamar o povo à penitência e à conversão, por causa de uma calamidade (uma invasão de gafanhotos) que devasta a Judeia. Unicamente o Senhor pode salvar do flagelo e, por conseguinte, é necessário suplicá-lo com orações e jejuns, confessando o próprio pecado.

O profeta insiste sobre a conversão interior: “Voltai para mim com todo o vosso coração” (2, 12).

Voltar para o Senhor “com todo o vosso coração” significa empreender o caminho de uma conversão não superficial nem transitória, mas sim um itinerário espiritual que diz respeito ao lugar mais íntimo da nossa pessoa. Com efeito, o coração é a sede dos nossos sentimentos, o centro no qual amadurecem as nossas escolhas e as nossas atitudes. Aquele “voltai para mim com todo o vosso coração” não se refere unicamente aos indivíduos, mas estende-se à comunidade inteira, é uma convocação dirigida a todos: “reuni o povo; santificai a assembleia, agrupai os anciãos, congregai as crianças e os lactentes; saia o recém-casado dos seus aposentos, e a esposa da sua câmara nupcial.

O profeta medita de maneira particular sobre a prece dos sacerdotes, observando que ela deve ser acompanhada de lágrimas. Far-nos-á bem a todos, mas especialmente a nós sacerdotes, no início desta Quaresma, pedir o dom das lágrimas, de modo a tornar a nossa oração e o nosso caminho de conversão cada vez mais autênticos e sem hipocrisia. Far-nos-á bem interrogar-nos: “Eu choro? O Papa chora? Os cardeais choram? Os bispos choram? Os consagrados choram? Os sacerdotes choram? Há pranto nas nossas orações?”. É precisamente esta a mensagem do Evangelho deste dia. No trecho de Mateus, Jesus volta a ler as três obras de piedade previstas na lei mosaica: a esmola, a oração e o jejum. E distingue a situação exterior da interior, daquele chorar com o coração. Ao longo do tempo, estas prescrições foram corroídas pela ferrugem do formalismo exterior, ou até se transformaram num sinal de superioridade social. Jesus põe em evidência uma tentação comum nestas três obras, que se pode resumir precisamente na hipocrisia (que é mencionada três vezes): “Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos homens, para serdes admirados por eles… Quando, pois, deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas… Quando orardes, não façais como os hipócritas, que gostam de orar de pé… para serem vistos pelos homens… E quando jejuardes, não tenhais um ar triste, como os hipócritas” (Mateus 6, 1.2.5.16). Irmãos, estai conscientes de que os hipócritas não sabem chorar, já se esqueceram de como se chora, não pedem o dom das lágrimas.

Quando realizamos algo de bom, quase instintivamente nasce em nós o desejo de sermos estimados e até admirados por esta boa ação, para recebermos uma satisfação. Mas Jesus convida-nos a realizar as boas obras sem qualquer ostentação, confiando unicamente na recompensa do Pai, “que vê o segredo” (Mateus 6, 4.6 e 18).

Estimados irmãos e irmãs, o Senhor nunca se cansa de ter misericórdia de nós, e deseja oferecer-nos mais uma vez o seu perdão — todos nós temos necessidade disto – convidando-nos a voltar para Ele com um coração novo, livres do mal e purificados pelas lágrimas, para participar na sua alegria. Como responder a este convite? É são Paulo quem sugere: “Rogamos-vos, em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus!“ (2 Cor 5, 20). Este esforço de conversão não é apenas uma obra humana, mas significa deixar-se reconciliar. A reconciliação entre nós e Deus é possível graças à misericórdia do Pai que, por amor a nós, não hesitou em santificar o seu único Filho. Com efeito Cristo, que era justo e não conhecia o pecado, fez-se pecado por nós (cf. v. 21), quando na cruz assumiu os nossos pecados, e deste modo nos resgatou e justificou diante de Deus. NELE nós podemos tornar-nos justos, nele nós podemos mudar, se acolhermos a graça de Deus e não deixarmos passar em vão este “momento favorável” (6, 2). Por favor, paremos, detenhamo-nos um pouco, para nos deixarmos reconciliar com Deus!

Com esta consciência, comecemos confiantes e jubilosamente o itinerário quaresmal. Maria Mãe Imaculada, sem pecado, sustente o nosso combate espiritual contra o pecado, acompanhando-nos neste momento favorável, a fim de que possamos entoar juntos a exultação da vitória no dia da Páscoa. E como sinal da vontade de nos deixarmos reconciliar com Deus, além das lágrimas que estarão «no segredo», em público também realizaremos o gesto da imposição das Cinzas sobre a cabeça. O celebrante pronuncia as seguintes palavras: “PORQUE ÉS PÓ, E PÓ TE HÁS DE TORNAR” (cf. Gênesis 3, 19), ou então repete a exortação de Jesus: “CONVERTEI-VOS E CREDE NO EVANGELHO” (cf. Marcos 1, 15). Ambas as fórmulas constituem uma evocação da verdade acerca da existência humana: somos criaturas limitadas, pecadores sempre necessitados de penitência e de conversão. Como é importante ouvir e aceitar tal exortação nesta nossa época! Por isso, o convite à conversão constitui um impulso a voltar, como fez o filho da parábola, aos braços de Deus, Pai terno e misericordioso, a chorar naquele abraço, a confiar nele e a entregar-se a Ele.

Texto: PAPA FRANCISCO
Imagem de Gini George por Pixabay