A liturgia do III Domingo do Tempo Comum propõe-nos a continuação da reflexão iniciada no domingo passado. Recorda, uma vez mais, que Deus ama cada homem e cada mulher e chama-o à vida plena e verdadeira. A resposta do homem ao chamamento de Deus passa por um caminho de conversão pessoal e de identificação com Jesus.
A primeira leitura (Jn 3,1-5.10) diz-nos – através da história do envio do profeta Jonas a pregar a conversão aos habitantes de Nínive – que Deus ama todos os homens e a todos chama à salvação. A disponibilidade dos ninivitas em escutar os apelos de Deus e em percorrer um caminho imediato de conversão constitui um modelo de resposta adequada ao chamamento de Deus.
No Evangelho (Mc 1,14-20) aparece o convite que Jesus faz a todos os homens para se tornarem seus discípulos e para integrarem a sua comunidade. Marcos avisa, contudo, que a entrada para a comunidade do Reino pressupõe um caminho de “conversão” e de adesão a Jesus e ao Evangelho.
A segunda leitura (1Cor 7,29-31) convida o cristão a ter consciência de que “O TEMPO É BREVE” – isto é, que as realidades e valores deste mundo são passageiros e não devem ser absolutizados. Deus convida cada cristão, em marcha pela história, a viver de olhos postos no mundo futuro – quer dizer, a dar prioridade aos valores eternos, a converter-se aos valores do “Reino”.
Leituras
1A palavra do Senhor foi dirigida a Jonas,
pela segunda vez:
2‘Levanta-te
e põe-te a caminho da grande cidade de Nínive
e anuncia-lhe a mensagem que eu te vou confiar’.
3Jonas pôs-se a caminho de Nínive,
conforme a ordem do Senhor.
Ora, Nínive era uma cidade muito grande;
eram necessários três dias para ser atravessada.
4Jonas entrou na cidade,
percorrendo o caminho de um dia;
pregava ao povo, dizendo:
‘Ainda quarenta dias, e Nínive será destruída’.
5Os ninivitas acreditaram em Deus;
aceitaram fazer jejum, e vestiram sacos,
desde o superior ao inferior.
10Vendo Deus as suas obras de conversão
e que os ninivitas se afastavam do mau caminho,
compadeceu-se e suspendeu o mal
que tinha ameaçado fazer-lhes, e não o fez.
Palavra do Senhor.
R. Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos,
vossa verdade me oriente e me conduza!
4aMostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos,*
4be fazei-me conhecer a vossa estrada!
5aVossa verdade me oriente e me conduza,*
5bporque sois o Deus da minha salvação.R.
6Recordai, Senhor meu Deus, vossa ternura *
e a vossa compaixão que são eternas!
7bDe mim lembrai-vos, porque sois misericórdia*
7ce sois bondade sem limites, ó Senhor!R.
8O Senhor é piedade e retidão,*
e reconduz ao bom caminho os pecadores.
9Ele dirige os humildes na justiça,*
e aos pobres ele ensina o seu caminho.R.
29Eu digo, irmãos: o tempo está abreviado.
Então que, doravante, os que têm mulher
vivam como se não tivessem mulher;
30e os que choram,
como se não chorassem,
e os que estão alegres,
como se não estivessem alegres;
e os que fazem compras,
como se não possuíssem coisa alguma;
31e os que usam do mundo,
como se dele não estivessem gozando.
Pois a figura deste mundo passa.
Palavra do Senhor.
14Depois que João Batista foi preso,
Jesus foi para a Galiléia,
pregando o Evangelho de Deus e dizendo:
15‘O tempo já se completou
e o Reino de Deus está próximo.
Convertei-vos e crede no Evangelho!’
16E, passando à beira do mar da Galiléia,
Jesus viu Simão e André, seu irmão,
que lançavam a rede ao mar, pois eram pescadores.
17Jesus lhes disse:
‘Segui-me e eu farei de vós pescadores de homens’.
18E eles, deixando imediatamente as redes,
seguiram a Jesus.
19Caminhando mais um pouco,
viu também Tiago e João, filhos de Zebedeu.
Estavam na barca, consertando as redes;
20e logo os chamou.
Eles deixaram seu pai Zebedeu na barca com os
empregados, e partiram, seguindo Jesus.
Palavra da Salvação.
Fonte: Liturgia Diária – CNBB
Reflexão
O NASCIMENTO DO REINO
“Estabeleço que o terceiro domingo do tempo comum seja dedicado à celebração, reflexão e difusão da Palavra de Deus. Este domingo da Palavra de Deus se coloca em um momento oportuno desse período do ano, no qual somos convidados a fortalecer os laços com os judeus e a rezar pela unidade dos cristãos.” (Papa Francisco)
O Domingo da Palavra que hoje celebramos é um convite a abordá-la como Palavra de Vida, transformadora, que nos desafia, que espera de nós uma resposta, que nos torna de alguma forma contemporâneos e protagonistas daquilo que nos narra o Evangelho.
A primeira coisa é perceber que a cena de hoje não é “simplesmente” a apresentação de personagens que vão acompanhar Jesus na sua missão missionária. Tampouco é “simplesmente” a descrição histórica de como tudo começou, para que fiquemos como espectadores distantes do que ali aconteceu com alguns que foram chamados por Jesus. Um dos objetivos dos evangelistas é ajudar as gerações futuras a conhecer e seguir Jesus, é com esse critério (não só) que escrevem os evangelhos.
E é natural que nos primeiros passos de Jesus na sua missão missionária, procure alguns discípulos, alguns companheiros que serão por ele transformados e que também interajam entre eles. Em outras palavras: que o Reino de Jesus começa pela formação de uma comunidade, e que seus seguidores respondam a ele pessoalmente, e que sua resposta envolva aceitar e caminhar com outros que o Senhor está escolhendo.
É também relevante que o “cenário” que Jesus escolhe para iniciar a sua missão não é o Templo sagrado, nem a Cidade Santa, nem em um contexto religioso: é no lago, na Galileia, no lugar da vida cotidiana das pessoas. Como também o “perfil” que Jesus busca: eles não são especialistas no Direito, não são especialmente treinados intelectualmente, não há evidências de que sejam “fiéis adeptos” aos muitos preceitos judaicos, nem fazem parte de nenhuma das castas político-religiosas de seu tempo: são pessoas comuns. Sabemos de alguns que eram pescadores ou cobradores de impostos (malvistos e desprezados por sua profissão). Não sabemos muito sobre os outros. Não era comum o Rabino escolher seus discípulos. Era justamente ao contrário. Além disso, Jesus os convida a segui-lo sem explicações, sem projeto (bem: ser “pescadores de homens“, mas certamente não entenderam muito no momento), sem promessas… sem desculpas (deixando as redes, contadores de impostos…). Não busca “seguidores” a tempo parcial, nem que os empregos, a família, os impeçam de segui-lo. É “ESTAR COM ELE” como prioridade absoluta.
Pouco antes dessas chamadas, e como eco da pregação de João Batista, ele proclama: “CONVERTEI-VOS E CREDE NO EVANGELHO“. Mas é um eco e um tom diferente do Precursor: É encabeçado por uma Boa Nova (= Evangelho) de Deus, não há indícios de ameaças (como as de João ou de Jonas, por exemplo: a cidade será destruída…). É que Deus (O SEU REINO) está próximo e isso desperta a esperança, as expectativas, a alegria, a consolação do povo, especialmente dos que estão em pior situação.
Essa proximidade com Deus não está “ligada” a um lugar, ou a práticas religiosas, ou a uma doutrina, nem tem quaisquer outras condições além de “CRER” nessa presença próxima e bondosa de Deus. Jesus aqui não reprova nem menciona pecado ou arrependimento. O seu chamado à conversão significa e supõe uma mudança de mentalidade, capaz de se abrir à novidade que Jesus traz com a sua presença e o seu Evangelho. É a mesma coisa que disse a Nicodemos: “tens que nascer de novo”, tens que fazer a limpeza mental e vital de muitas coisas aprendidas que limitam o encontro autêntico com Deus. Precisamente aqueles que não quiseram mudar de mentalidade, para continuar com o de sempre e como sempre e defendê-la e protegê-la a todo custo… serão precisamente aqueles que o conduzirão à cruz.
O conteúdo principal de sua missão é a preocupação primária de seu Deus Pai pelo homem. E será a principal preocupação e tarefa dos seus seguidores de então e de todos os tempos: os homens, ser “pescadores de homens“. Procurar a “ovelha perdida”, acolher os “filhos pródigos”, virar a terra de cabeça para baixo até que apareça a moeda perdida. Portanto, o seu Evangelho não será um conjunto de doutrinas, nem ritos, nem práticas, nem… Será “proximidade“, “aproximar-se” em nome de Deus de quem tem fome, sede, falta de justiça, está nu, doente, aquele que não têm direitos… Esta é a boa notícia. É o que Jesus “fará“, do verbo “fazer”, acompanhado de suas palavras: buscar, perdoar, curar, abençoar… E o grupo de discípulos que o acompanha deverá tornar visível com suas ações, atitudes, prioridades e palavras (“VEDE COMO SE AMAM“) a proposta de vida de Jesus.
Bem… nada mais (e nada menos!). Agora é uma questão de ver o que esta Palavra me diz pessoalmente neste momento da minha vida: rezá-la, aceitá-la, assumi-la na minha própria vida e… CAMINHAR COM OS OUTROS PELAS NOVAS GALILÉIAS.
Texto: Quique Martínez de la Lama-Noriega, cmf
Imagem: Photo by MAX PROKOP em Unsplash
Fonte: Comunidade católica Ciudad Redonda (Missionários Claretianos)