
O Domingo de Ramos da Paixão do Senhor nos coloca diante do maior paradoxo da fé cristã: um Deus que reina através da humildade, vence pela entrega, e transforma o mundo não com poder, mas com amor crucificado. A liturgia deste dia não é apenas uma recordação, mas um convite a entrar no mistério de um amor que não calcula, não recua e não se poupa.
A Primeira Leitura (Is 50,4-7) apresenta um profeta anônimo, chamado a anunciar a Palavra de Deus mesmo quando isso lhe custa insultos e sofrimento. Ele não se cala, porque sua confiança está no Senhor. Os primeiros cristãos viram neste servo sofredor uma prefiguração de Cristo — aquele que, mesmo inocente, aceita o sofrimento por amor.
Quantas vezes preferimos o silêncio cômodo ao anúncio corajoso da verdade? Este texto nos desafia: a fidelidade a Deus nem sempre traz aplausos, mas sempre traz significado.
Na Segunda Leitura (Fl 2,6-11), São Paulo nos apresenta o “hino cristológico” mais profundo da Bíblia: Cristo, sendo Deus, esvaziou-se, assumiu a condição de servo e obedeceu até a morte na cruz.
Essa não é apenas uma declaração teológica, mas um modelo de vida. Jesus poderia ter exigido glória, mas escolheu a simplicidade; poderia ter dominado, mas preferiu servir. E é esse mesmo caminho que nos é proposto: renunciar ao orgulho, abraçar a humildade e encontrar grandeza na doação.
O Evangelho (Lc 22,14–23,56) nos leva ao coração do mistério: a Última Ceia, a agonia no Horto, o julgamento injusto, a crucifixão. Em cada passo, Jesus poderia ter revidado, mas escolheu o perdão.
Aqui está a essência do Evangelho: o amor que não barganha, não desiste, não se corrompe. A cruz, que parecia o fim, torna-se o início de uma nova humanidade — libertada não pela força, mas pela misericórdia.
A sociedade hoje prega que vencer é dominar, que amar é receber, que felicidade é acumular. Mas Cristo subverte essa lógica: O VERDADEIRO TRIUNFO ESTÁ EM DAR A VIDA; A VERDADEIRA FORÇA, NA FRAQUEZA ASSUMIDA POR AMOR.
A pergunta que fica é: Estamos dispostos a seguir esse caminho?
A cruz não foi apenas o destino de Jesus — é o chamado de todo cristão. Tomaremos a nossa e O seguiremos?
O Domingo de Ramos não é só sobre ramos e hosanas, mas sobre a escolha radical de um amor que vai até o fim. Que possamos, nesta semana santa, contemplar a cruz não com tristeza, mas com gratidão — pois nela, Deus nos mostrou que O AMOR, MESMO CRUCIFICADO, SEMPRE RESSUSCITA.
Leituras
Eis que vem Aquele que transforma nossos ‘hosanas’ em esperança viva, que entra não sobre um trono de ouro, mas sobre um jumentinho – bendito seja o Rei que vem em nome do Senhor, trazendo não espadas, mas paz; não dominação, mas o amor que se inclina para lavar nossos pés!
enviou dois de seus discípulos, dizendo:
que nunca foi montado.
Desamarrai-o e trazei-o aqui.
respondereis assim: ‘O Senhor precisa dele'”.
“Por que estais desamarrando o jumentinho?”
e ajudaram Jesus a montar.
aos gritos e cheia de alegria,
começou a louvar a Deus
por todos os milagres que tinha visto.
Paz no céu e glória nas alturas!”
“Mestre, repreende teus discípulos!”
se eles se calarem, as pedras gritarão”.
Palavra da Salvação.
Mesmo quando as bofetadas da vida doem e o gosto amargo da humilhação queima, ‘não desviei meu rosto‘ – pois quem caminha com Deus sabe que a verdadeira dignidade nasce na fidelidade que vence toda vergonha!
palavras de conforto à pessoa abatida;
ele me desperta cada manhã e me excita o ouvido,
para prestar atenção como um discípulo.
não desviei o rosto de bofetões e cusparadas.
conservei o rosto impassível como pedra,
porque sei que não sairei humilhado.
Palavra do Senhor.
“‘Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?’ – no abismo da dor, até Cristo gritou; mas eis o mistério: é no grito da alma que Deus tece a ressurreição!
Transpassaram minhas mãos e os meus pés *
e respeitai-o, toda a raça de Israel! R.
‘Humilhou-se a si mesmo’ – eis o paradoxo divino: Cristo desceu ao pó da terra para nos elevar aos céus, provando que a verdadeira grandeza nasce quando o amor se abaixa!
e tornando-se igual aos homens.
Encontrado com aspecto humano,
na terra e abaixo da terra,
para a glória de Deus Pai.
Palavra do Senhor.
‘Desejei ardentemente comer convosco esta ceia pascal’ – eis o coração de Deus: um anseio tão humano de comunhão, que transforma até a cruz em banquete de amor eterno!
Desejei ardentemente comer convosco esta ceia pascal, antes de sofrer.
até que venha o Reino de Deus”.
Fazei isto em memória de mim.
“Isto é o meu corpo, que é dado por vós.
Fazei isto em memória de mim”.
“Este cálice é a nova aliança no meu sangue,
que é derramado por vós”.
Eu, porém, estou no meio de vós como aquele que serve.
e os que têm poder se fazem chamar benfeitores.
e o que manda, como quem está servindo.
Não é quem está sentado à mesa?
Eu, porém, estou no meio de vós como aquele que serve.
e sentar-vos em tronos
para julgar as doze tribos de Israel.
Tu, uma vez convertido, fortalece os teus irmãos.
34 Jesus, porém, respondeu:
três vezes tu negarás que me conheces”.
Eles responderam: “Nada”.
do mesmo modo, quem tiver uma sacola;
e quem não tiver espada,
venda o manto para comprar uma.
37 Porque eu vos digo:
‘Ele foi contado entre os malfeitores’.
Pois o que foi dito a meu respeito tem de se realizar”.
Os discípulos o acompanharam.
que caíam no chão.
e encontrou-os dormindo, de tanta tristeza.
que se aproximou de Jesus para beijá-lo.
“Senhor, vamos atacá-los com a espada?”
que tinham vindo prendê-lo:
“Vós saístes com espadas e paus,
como se eu fosse um ladrão?
Mas esta é a vossa hora, a hora do poder das trevas”.
Pedro saiu para fora e chorou amargamente.
Pedro acompanhava de longe.
Pedro sentou-se no meio deles.
“Este aqui também estava com ele!”
Mas Pedro respondeu: “Homem, não sou”.
porque é galileu!”
Mas Pedro respondeu:
enquanto Pedro ainda falava, um galo cantou.
que o Senhor lhe tinha dito:
“Hoje, antes que o galo cante, três vezes me negarás”.
Profetiza quem foi que te bateu?
Levaram Jesus ao tribunal deles.
reuniram-se em conselho
e levaram Jesus ao tribunal deles.
68 e, se eu vos fizer perguntas, não me respondereis.
Jesus respondeu:
“Vós mesmos estais dizendo que eu sou!”
Nós mesmos o ouvimos de sua própria boca!”
Não encontro neste homem nenhum crime.
fazendo subversão entre o nosso povo,
proibindo pagar impostos a César
e afirmando ser ele mesmo Cristo, o Rei”.
desde a Galileia, onde começou, até aqui”.
pois também Herodes estava em Jerusalém naqueles dias.
Herodes, com seus soldados, tratou Jesus com desprezo.
Já ouvira falar a seu respeito
e esperava vê-lo fazer algum milagre.
e mandou-o de volta a Pilatos.
Pilatos entregou Jesus à vontade deles.
Pois bem! Já o interroguei diante de vós e não encontrei nele
nenhum dos crimes de que o acusais;
Não encontrei nele nenhum crime que mereça a morte.
Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”.
E a gritaria deles aumentava sempre mais.
e entregou Jesus à vontade deles.
Filhas de Jerusalém, não choreis por mim!
que voltava do campo,
e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus.
Chorai por vós mesmas e por vossos filhos!
os ventres que nunca deram à luz
e os seios que nunca amamentaram’.
Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!
um à sua direita e outro à sua esquerda.
repartindo entre si as roupas de Jesus.
Este é o Rei dos Judeus.
“A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo,
se, de fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!”
Hoje estarás comigo no Paraíso.
tu que sofres a mesma condenação?
mas ele não fez nada de mal”.
Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.
até às três horas da tarde,
Dizendo isso, expirou.
Aqui todos se ajoelham e faz-se uma pausa.
“De fato! Este homem era justo!”
e voltaram para casa, batendo no peito.
ficaram à distância, olhando essas coisas.
José colocou o corpo de Jesus num túmulo escavado na rocha.
Ele era de Arimateia, uma cidade da Judeia,
e esperava a vinda do Reino de Deus.
onde ninguém ainda tinha sido sepultado.
e como o corpo de Jesus ali fora colocado.
E, no sábado, elas descansaram,
conforme ordenava a Lei.
Palavra da Salvação.
Homilia
JESUS ENTRA NA CIDADE, NUM JUMENTINHO.

Jesus entra na cidade num jumentinho: rejeitando todo o triunfalismo, recusando-se a impor-se, ou a aproveitar-se de tantos que o apoiam e aclamam, rejeitando qualquer tipo de violência, chega “em paz“, rejeitando as expectativas do povo, que está à espera de um Messias libertador.
Deus não vem como gostaríamos, como gostaríamos que ele viesse… Ele não é um político populista, que tira partido do desencanto das pessoas.
Portanto, este jumentinho que Jesus escolheu impede-nos certamente, pois obriga-nos a renunciar aos nossos sonhos de grandeza, de triunfo, de influenciar para alcançar os nossos nobres objetivos… E, em vez disso, nos faz optar por um trabalho simples, humilde e tenaz, entre pessoas sem poder…
Optar pela Palavra que constrói, pela proximidade com aqueles que sofrem, pela cura, para a transformação dos corações, para a integração dos descartados, mesmo que isto seja cansativo e lento para produzir resultados; obriga-nos a baixar a nossa guarda, renunciando às nossas armas e escudos, para O acolher com paz, com os nossos mantos, com as nossas canções, com os nossos gritos de esperança, reconhecendo que precisamos da presença de Deus entre nós, e atento quando ele se apresenta de formas tão desconcertante, acolhendo-O e aclamando-O com a alegria das crianças.
Porém corremos sempre o risco de que o espetáculo externo, as aclamações, a procissão, as canções, as liturgias… tenham pouco a ver com o que “acontece” no interior. Todas aquelas pessoas que vieram à procissão com as suas palavras e ramos de oliveira, que o recebem, o aclamam, o aplaudem… onde estão nos dias seguintes? Identificaram-se com ele, colocaram-se à sua disposição? Assim que terminaram o desfile, foram para casa como se nada tivesse acontecido. Disseram que estavam com o Messias, que confiavam nele… MAS NÃO FICARAM COM ELE. No interior, nada parece ter mudado. Como se esperassem tudo de Deus… mas sem fazer nada de sua parte.
Por isso, a leitura da Paixão (segundo São Lucas) e a Primeira Leitura nos advertem. Este homem que se despojou de sua grandeza, que se apresentou (apresenta-se) como escravo, que suporta cuspe, chicotadas, insultos e desprezos, que ficou sem túnica, HOMEM NU, sem títulos, sem multidões ao redor, ele deixa-nos nus, com a nossa verdade no ar.
Quando ele realmente se apresenta como é – e não é fácil reconhecê-lo – haverá aqueles que:
Como pessoas, podem sentar e cuidar de seus negócios e mudar de ideia em um único dia, de “filho de Davi” para “crucificá-lo“.
Como sumos sacerdotes, podemos acusá-lo de muitas coisas:
- de perturbar as nossas ideias e expectativas em relação a Deus
- de expor em evidencia a hipocrisia da nossa religiosidade e culto
- de protestar e reclamar porque não resolve os nossos problemas: Onde estás quando rebenta uma guerra que não queremos? Onde estás quando a doença se apodera dos nossos? Onde estás quando não sabemos o que escolher nas nossas vidas? Porque nos fazes sentir mal quando os nossos estilos, planos e escolhas… não concordam, não se parecem com os teus?
Como Pilatos, teríamos muitas perguntas a fazer-lhe, mas nenhum interesse nas suas respostas, se pretendemos defender os nossos «tronos», significa reconhecer que temos outros senhores a quem servimos, se podemos «perder» algo… se preferirmos lavar as mãos ao invés de nos molharmos para defender a justiça e a verdade.
Como Simão de Cirene, devemos nos mostrar dispostos a ajudá-lo com sua cruz, mesmo que a iniciativa não tenha sido nossa, e talvez o façamos com relutância.
Como x’, o nosso testemunho público pode ser posto à prova e a nossa autossuficiência e a nossa postura de bravura podem ser abaladas.
Podemos também continuar a rezar com ele na noite da fé (rezar para não cair em tentação), ou adormecer primeiro, e fugir depois.
Podemos aceitar seu Pão e seu Cálice, permitir que ele lave nossos pés… ou recusa-lo e ir embora…
Em suma, veremos onde e como cada um se situa na celebração desta Semana Santa. Porque o Evangelho é a Palavra Viva hoje, não é uma simples “memória” do que aconteceu… mas do que continua a acontecer entre nós hoje. A história se repete, e cada um de nós escolherá um ou mais “papéis” para assistir HOJE à Paixão de Cristo.
Texto: QUIQUE MARTÍNEZ DE LA LAMA-NORIEGA, CMF
Fonte: Ciudad Redonda