A liturgia do XXXIII Domingo do Tempo Comum reflete sobre o sentido da história da salvação e nos diz que a meta final para onde Deus nos conduz é o novo céu e a nova terra da felicidade plena, da vida definitiva. Este quadro (que deve ser o horizonte que os nossos olhos contemplam em cada dia da nossa caminhada neste mundo) faz nascer em nós esperança; e da esperança brota a CORAGEM para enfrentar a adversidade e para lutar pelo advento do Reino.
Na primeira leitura (Ml 3,19-20a), um “MENSAGEIRO DE DEUS” anuncia a uma comunidade desanimada, Incrédulae apática que Jahwéh não abandonou o seu Povo. O Deus libertador vai intervir no mundo, vai derrotar o que oprime e rouba a vida e vai fazer com que nasça esse “sol da justiça” que traz a salvação.
O Evangelho (Lc 21,5-19) oferece-nos uma reflexão sobre o percurso que a Igreja é chamada a percorrer, até à segunda vinda de Jesus. A missão dos discípulos em caminhada na história é comprometer-se na transformação do mundo, de forma a que a velha realidade desapareça e nasça o Reino. Esse “CAMINHO” será percorrido no meio de dificuldades e perseguições; mas os discípulos terão sempre a ajuda e a força de Deus.
A segunda leitura (2Ts 3,7-12) reforça a ideia de que, enquanto esperamos a vida definitiva, não temos o direito de nos instalarmos na preguiça e no comodismo, alheando-nos das grandes questões do mundo e evitando dar o nosso contributo na construção do Reino.
Leituras
Muitas vezes temos a sensação de que o nosso mundo caminha para o abismo e que nada pode detê-lo. Olhamos para o mapa dos conflitos bélicos e vemos pintados de sangue o presente e o futuro de tantos povos; olhamos para a natureza e a vemos devorados pelos interesses das multinacionais da indústria; olhamos para as pessoas e as vemos fechadas no seu cantinho, sem grandes ideias que possam mudar este quadro… A questão é: a esperança ainda faz sentido? Este mundo tem saída? Um profeta anônimo há 2450 anos dá voz à esperança e garante-nos: DEUS NÃO NOS ABANDONOU; ELE VAI INTERVIR – ELE ESTÁ SEMPRE A INTERVIR – NO MUNDO…
e esse dia vindouro haverá de queimá-los,
diz o Senhor dos exércitos,
tal que não lhes deixará raiz nem ramo.
trazendo salvação em suas asas.
Palavra do Senhor.
O Senhor, virá,julgará a terra inteira.
Julgará com justiça e com equidade.
R. O Senhor virá julgar a terra inteira; com justiça julgará.
7 Aplauda o mar com todo ser que nele vive,*
o mundo inteiro e toda gente!
8 As montanhas e os rios batam palmas*
e exultem de alegria. R.
9a Exultem na presença do Senhor, pois ele vem,*
vem julgar a terra inteira.
9b Julgará o universo com justiça *
9c e as nações com equidade. R.
Ao contrário do que dizem alguns “iluminados”, o cristianismo não fomenta a evasão deste mundo, nem pretende fazer alienados que vivam de olhos postos no céu e passem ao lado das lutas dos outros homens… Pelo contrário, o cristianismo vivido com verdade, seriedade e coerência, fortalece o empenho na construção de um mundo mais justo e mais fraterno, todos os dias, vinte e quatro horas por dia. O “REINO DE DEUS” é uma realidade que atingirá o ponto culminante na vida futura; mas começa a ser construído AQUI e AGORA e exige o esforço e o empenho de todos. Qual é a minha atitude em face disto? Dou o meu contributo na construção do REINO? Ponho a render os meus dons a serviço desta construção?
de dia e de noite, para não sermos pesados a ninguém.
“Quem não quer trabalhar, também não deve comer”.
Palavra do Senhor.
O que parece, aqui, fundamental, não é o discurso sobre o “fim do mundo”, mas sim o discurso sobre o percurso que devemos percorrer, até chegarmos à plenitude da história humana… Trata-se de uma caminhada que não nos leva ao aniquilamento, à destruição absoluta, ao fracasso total, mas à vida nova, à vida plena; por isso, deve ser uma caminhada que devemos percorrer de cabeça levantada, cheios de alegria e de esperança.
e com ofertas votivas.
Jesus disse:
Tudo será destruído”.
de que estas coisas estão para acontecer?”
porque muitos virão em meu nome, dizendo:
‘Sou eu!’ e ainda: ‘O tempo está próximo.’
Não sigais essa gente!
É preciso que estas coisas aconteçam primeiro,
mas não será logo o fim.’
um país atacará outro país.
acontecerão coisas pavorosas
e grandes sinais serão vistos no céu.
sereis entregues às sinagogas e postos na prisão;
sereis levados diante de reis e governadores
por causa do meu nome.
E eles matarão alguns de vós.
Reflexão
ESPERANDO O ÚLTIMO DIA
Estamos no penúltimo domingo do ano litúrgico, e os textos bíblicos nos falam do fim da história, do final dos tempos, do juízo final, da colheita, dos fogos e fornos, de separar, do castigo e da recompensa…
Há pouco tempo esses temas estavam muito presentes na pregação, e se utilizavam relatos como os de hoje para ameaçar, assustar e lançar condenações contra isso e além. Talvez hoje tenhamos ido ao outro extremo, e esse tema seja silenciado, evitado. Entre as crenças de muitos cristãos, palavras como Juízo Final, condenação, salvação, inferno e até mesmo a ressurreição dos mortos deixaram de estar presentes, o que em alguns casos foi substituído por coisas tão exóticas e estranhas à nossa fé como reencarnação, transmigração de almas, a libertação do espírito/carma ou a “fusão com a energia natural”… E não faltam alguns grupos (seitas), aproximando pessoas, geralmente não treinadas em questões bíblicas e de fé, com “o fim da o mundo”, que está lá, logo na esquina do ano “X”, e em todos os lugares eles veem sinais desse fim ameaçador e terrível…
As leituras deste XXXIII Domingo nos oferecem algumas chaves para colocar este tema em seu devido lugar.
- Em primeiro lugar o profeta MALAQUIAS. Os israelitas de seu tempo questionavam que sentido tinham suas boas ações, qual era o sentido de cumprir os mandamentos de Deus… quando davam conta que os malvados iam muito bem neste mundo, e os justos, os bons tinham muitas dificuldades, e frequentemente o fracasso mais absoluto. É uma pergunta lógica a ser feita hoje também, já que o mal está muito presente em nosso mundo, apesar dos esforços muitas vezes fúteis dos “BONS“.
O profeta começa assegurando que Deus é fiel e nunca abandona aqueles que o temem e o servem… e anuncia que haverá um dia, o dia do Juízo, para colocar cada um em seu lugar, de fazer um balanço da vida de cada um, e fazer justiça a quem foi injustiçado… Afirmar que Deus fará justiça não implica rejeitar a afirmação de que “DEUS É BOM“, que sempre perdoa, e que ele quer salvar a todos, porque não podemos esquecer que o homem foi criado com liberdade, e isso inclui a possibilidade de autodestruição, a opção pelo mal, a traição dos irmãos, etc… diante do qual Deus não intervém, deixando que assumam os riscos e as suas consequências, porque ao nos criar, decidiu respeitar absolutamente nossa liberdade e responsabilidade pessoal.
Em um mundo agrícola como o daquele tempo, era lógico recorrer a imagens do campo para explicar esse fato: a colheita, onde o grão é separado da palha, o grão é armazenado e a palha queimada. Talvez hoje se falasse em jogá-lo nos recipientes para ser “reciclado”… A imagem é apenas uma imagem, um símbolo.
Mas o anúncio do JUÍZO FINAL não foi vivido com medo pelos fiéis: não foi uma ameaça para eles, mas um acontecimento que os encheu de esperança e força para suas vidas aqui. Estariam rodeados de luz, a paz os envolveria, desfrutariam do Banquete do Reino, veriam Deus face a face…
“Para vós, que temeis o meu nome,nascerá o sol da justiça,
trazendo salvação em suas asas.” (Primeira leitura).
- No tempo de Jesus, muitos tinham como certo que a chegada daquele Dia anunciado pelos profetas era iminente, e esperavam uma intervenção espetacular de Deus, da qual alguns se aproveitaram para suas pregações ameaçadoras e seus interesses pessoais (financeiros e tudo mais). E Jesus esclarece algumas coisas que se aplicam a nós para todos os tempos:
Que muitos virão “em nome de Deus“, ou fingindo ter as “chaves mágicas e secretas” mais do que os outros – normalmente já estão seguros – temos que fazer ante a dificil situação e a catástrofe que está vindo. Podem ser economistas, organizações internacionais, políticos, até líderes religiosos… Bem, não dê seu consentimento cegamente, não se conforme com a realidade, não abaixe a cabeça pensando que não há nada a fazer ou que só podemos fazer o que nos dizem…
Quando você vê (e vemos hoje) guerras e revoluções, terremotos, epidemias e fome, sustos e grandes sinais no céu… Quando você vê que os mercados estão cambaleando, que o desemprego está disparando, que o número de pessoas em risco de exclusão está crescendo, que há falta de recursos naturais e econômicos… não entre em pânico! São coisas do nosso mundo. Todos os sistemas e instituições, todos os títulos e todos os mecanismos econômicos… são temporários, acabam mais cedo ou mais tarde, às vezes com um grande colapso. A história está cheia de exemplos. Mas então: “Será a ocasião para você testemunhar“…
E reorientando a preocupação de seus ouvintes em outra direção, ele os adverte: Para vocês, meus discípulos, para aqueles que levam minha mensagem a sério, “eles porão as mãos sobre vocês, eles os perseguirão, eles os entregarão aos tribunais e para a prisão e eles vão comparecer perante reis e governadores por serem meus“. E até seus próprios parentes vão traí-los, matar alguns de vocês e odiá-los por causa do meu nome…
Este último tem que nos preocupar, porque nos afeta diretamente. É um sinal de que estamos no caminho certo. Jesus não colocou toalhas quentes em sua mensagem, nem escondeu seu radicalismo. E é por isso que ele afirma: ser um dos meus tem que supor dificuldades. E nesses casos temos que ser testemunhas, mostrar onde depositamos nossa confiança, para quais valores e estilo de vida escolhemos… Jesus, com seu anúncio do Evangelho, dava chaves para poder iluminar um novo mundo:
- Tornar as pessoas mais importantes do que as coisas.
- Cuidar da natureza como um dom de Deus, contando com as gerações futuras, e não apenas com nossas necessidades egoístas. Não sejamos predadores ou destruidores dele.
- Aprenda a viver com menos… para que pelo menos possamos (TODOS) viver. Que desperdício de recursos!
- Que não falte solidariedade entre todos os homens, não só com os que nos são próximos ou com os nossos.
- Lançar as bases da justiça, verdade e paz nas relações pessoais e sociais.
- Não “divinize” ou absolutize nada nem ninguém e sempre exija responsabilidades de nossos líderes políticos, econômicos e religiosos.
- Não nos deixemos vencer pelo desespero e pelo catastrofismo. E ser “perseverante” e testemunha no que é importante, no que é necessário, no que não é negociável.
- Encontrar o que nos aproxima, o que nos torna irmãos, o que nos une e não o que nos opõe.
- E aqui vem São Paulo com a segunda leitura: “Aprendi que alguns vivem desordenadamente, sem trabalhar, antes se envolvendo em tudo“. Ou seja: quando vemos fomes e guerras ao nosso lado, pessoas que vivem sozinhas, crianças sem família, jovens presos por drogas, manipulações, fraudes e vulgaridades, quando percebemos que tantos homens hoje não conhecem nem experimentam Deus , quando o consumo/individualismo/conforto se tornaram os novos eixos de nossas sociedades ocidentais, quando precisamos colocar tanto coração e compreensão do nosso lado, o que você faz? Você já se viu em dificuldades por ser um dos de Jesus? Você tem levado a sério as bem-aventuranças e o restante do Evangelho? Você encontrou problemas com os de sua própria família por ir contra a corrente? Você teve dificuldades em seu trabalho para fazer as coisas “como Deus pretendia”? Ou talvez você seja um daqueles que estão “muito ocupados” sem fazer nada? Algum? Nada que valha a pena, nada que conte no Banco Celestial Interplanetário onde somos chamados a ter “um tesouro” nas palavras do próprio Jesus? Assim salvaremos nossas almas/vidas.
Texto: QUIQUE MARTÍNEZ DE LA LAMA-NORIEGA, CMF
Fonte: MISSIONÁRIOS CLARETIANOS (CIUDAD REDONDA)