A liturgia do XXI Domingo do Tempo Comum nos coloca diante de uma escolha essencial, uma encruzilhada espiritual onde cada um de nós é convidado a decidir o rumo de sua existência. A vida nos oferece múltiplos caminhos, alguns revestidos de brilhos temporários, outros iluminados por uma luz eterna que transcende o efêmero. Neste cenário, Deus, com infinita paciência e amor, nos aponta a direção que nos conduz à plenitude; contudo, a decisão final repousa em nossas mãos.
Na Primeira Leitura (Js 24,1-2a.15-17.18b), vemos Josué reunindo as tribos de Israel em Siquém, um lugar de profunda significância histórica e espiritual. Ele apresenta ao povo uma escolha clara e decisiva: servir ao Senhor ou se desviar em busca de falsos deuses. A escolha do povo é inequívoca, pois reconhecem em Javé o único capaz de lhes proporcionar vida, liberdade e paz. Este momento reflete a profundidade da fé que nasce da experiência viva de um Deus que age na história e na vida de cada um de nós.
O Evangelho (Jo 6,60-69) nos coloca diante de uma divisão. De um lado, temos aqueles que, enredados na lógica mundana, buscam apenas a satisfação imediata de suas ambições e necessidades. São aqueles que, ao não compreenderem a profundidade do chamado de Jesus, optam por se afastar. Do outro lado, estão os Doze, discípulos que, abertos à ação divina, reconhecem em Jesus as palavras de vida eterna e se dispõem a segui-Lo no caminho do amor e da doação. Estes são os que mostram o verdadeiro caminho para todos os que desejam ser discípulos autênticos de Cristo.
Na Segunda Leitura (Ef 5,21-32), São Paulo nos lembra que a escolha por Cristo deve permear todas as dimensões de nossa vida, especialmente as relações familiares. O amor entre os esposos, a união e a comunhão que compartilham, devem ser um reflexo vivo da união de Cristo com sua Igreja. A família cristã, assim, torna-se um testemunho vibrante dos valores do Reino, um farol que ilumina o mundo com a luz do amor divino.
Este Domingo nos convida a refletir sobre nossas próprias escolhas. Estamos, como o povo de Israel, dispostos a reconhecer a ação de Deus em nossas vidas e a segui-Lo com convicção? Estamos prontos para, como os Doze, deixar para trás as armadilhas do mundo e abraçar o caminho de Cristo? Que nossa resposta seja um sim pleno, um compromisso de viver os valores eternos que verdadeiramente dão sentido à nossa existência.
Leituras
Com a firmeza de nossa fé e a clareza de nossa escolha, proclamamos: ‘Serviremos ao Senhor, porque Ele é o nosso Deus‘, o único que ilumina nossos dias com vida, liberdade e verdadeira paz.
os juízes e os magistrados,
que se apresentaram diante de Deus.
a quem vossos pais serviram na Mesopotâmia,
ou aos deuses dos amorreus,
em cuja terra habitais.
Quanto a mim e à minha família,
nós serviremos ao Senhor”.
para servir a deuses estranhos.
a nós e a nossos pais, da terra do Egito,
da casa da escravidão.
Foi ele quem realizou esses grandes prodígios
diante de nossos olhos,
e nos guardou por todos os caminhos
por onde peregrinamos,
e no meio de todos os povos pelos quais passamos.
Palavra do Senhor.
Contemple a bondade infinita do Senhor, pois só Ele pode preencher nossa alma
com a verdadeira doçura e paz que transcende o tempo.
R. Provai e vede quão suave é o Senhor!
2 Bendirei o Senhor Deus em todo o tempo,*
seu louvor estará sempre em minha boca.
3 Minha alma se gloria no Senhor;*
que ouçam os humildes e se alegrem! R.
16 O Senhor pousa seus olhos sobre os justos,*
e seu ouvido está atento ao seu chamado;
17 mas ele volta a sua face contra os maus,*
para da terra apagar sua lembrança. R.
18 Clamam os justos, e o Senhor bondoso escuta*
e de todas as angústias os liberta.
19 Do coração atribulado ele está perto*
e conforta os de espírito abatido. R.
20 Muitos males se abatem sobre os justos,*
mas o Senhor de todos eles os liberta.
21 Mesmo os seus ossos ele os guarda e os protege,*
e nenhum deles haverá de se quebrar. R.
22 A malícia do iníquo leva à morte,*
e quem odeia o justo é castigado.
23 Mas o Senhor liberta a vida dos seus servos,*
e castigado não será quem nele espera. R.
Este grande mistério, refletido na união de Cristo e da Igreja, revela o profundo
amor que transforma e une, chamando-nos a viver com reverência
e devoção em cada relação que cultivamos.
ele, o Salvador do seu Corpo.
mas santa e irrepreensível.
Aquele que ama a sua mulher ama-se a si mesmo.
como o Cristo faz com a sua Igreja;
e os dois serão uma só carne.
Palavra do Senhor.
Para onde mais iríamos, senão para Ti, Senhor? Tu possuis as palavras de vida eterna
que iluminam e transformam nossos dias com esperança e verdade.
“Esta palavra é dura.
Quem consegue escutá-la?”
Jesus perguntou:
“Isto vos escandaliza?
As palavras que vos falei são espírito e vida.
quem eram os que não tinham fé
e quem havia de entregá-lo.
ninguém pode vir a mim
a não ser que lhe seja concedido pelo Pai”.
e não andavam mais com ele.
Tu tens palavras de vida eterna.
Palavra da Salvação.
Homilia
QUANDO A COMUNHÃO É “PERIGOSA”
Quando Jesus anunciou a seus seguidores que lhes daria seu Corpo e Sangue, a maioria deles o abandonou. Apenas alguns poucos permaneceram, e a esses ele perguntou: “Vocês também querem ir embora?”. Algo semelhante continua acontecendo hoje, quando vemos que não é grande o número de cristãos que escutam atentamente a Palavra de Deus e que depois recebem com amor apaixonado o Pão Eucarístico.
Dividirei esta homilia em três partes:
- O Abandono da Comunhão Eucarística – Muitos cristãos, ao longo dos séculos, têm se afastado da prática da comunhão eucarística. Seja por falta de compreensão, seja por indiferença, o fato é que a participação na Eucaristia tem diminuído. Este abandono é um reflexo da dificuldade em aceitar e viver plenamente o mistério da fé.
- Comer a Carne, Beber o Sangue! – A declaração de Jesus foi, sem dúvida, escandalosa para muitos de seus seguidores. Comer a carne e beber o sangue de Cristo é uma imagem que desafia a lógica e a razão humanas. No entanto, é precisamente esse convite radical que nos chama a uma fé mais profunda e a uma compreensão mais plena do sacrifício de Cristo.
- Quando Comungar é Perigoso – Comungar sem a devida preparação e sem a compreensão do que realmente significa pode ser espiritualmente perigoso. A Eucaristia não é um simples símbolo; é uma realidade espiritual que exige reverência e preparação. Receber o Corpo e o Sangue de Cristo de maneira indigna é um ato grave que pode afastar ainda mais a pessoa da verdadeira comunhão com Deus.
O ABANDONO DA COMUNHÃO EUCARÍSTICA
O silencioso afastamento da comunhão eucarística está frequentemente ligado às normas da Igreja, que incluem a confissão prévia dos pecados, a intenção de mudança de comportamento e a reconciliação. Contudo, o Evangelho de hoje nos apresenta uma perspectiva diferente e mais profunda.
Jesus, em Suas palavras, desafia os discípulos com uma proposta radical: “comer Sua carne e beber Seu sangue“. Este ensinamento, que transcende as práticas e requisitos habituais, foi o verdadeiro motivo pelo qual muitos decidiram se afastar. A dificuldade não estava nas normas tradicionais para comungar, mas na linguagem direta e confrontadora de Jesus. Ele estava oferecendo algo muito mais profundo do que um simples ritual; Ele estava convidando Seus seguidores a uma união íntima e transformadora com Ele.
Este convite para comer Sua carne e beber Seu sangue não é apenas um desafio aos nossos sentidos, mas uma chamada a uma transformação espiritual profunda. Jesus nos convida a entrar em uma relação íntima e pessoal com Ele, a ser nutridos por Sua vida divina e a experimentar uma comunhão que vai além das práticas religiosas convencionais. Para muitos, isso representa um convite a mudar radicalmente a maneira como vivemos e entendemos a fé.
Ao refletirmos sobre isso, somos chamados a considerar: Será que estamos realmente abertos a essa união profunda com Cristo? Será que aceitamos os desafios que essa intimidade exige de nós? A mensagem de Jesus, longe de ser um conjunto de regras, é um convite ao amor e à transformação radical. Que possamos, então, responder a este convite com um coração aberto e uma fé renovada.
COMER A CARNE, BEBER O SANGUE!
A Eucaristia revela como Jesus foi o nosso Messias e Redentor, um Salvador que ofereceu Sua vida por nós. Suas palavras ainda chocam e provocam: “Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes Seu sangue, não tereis vida em vós.” Contudo, Jesus não estava falando de canibalismo; Ele era perfeitamente capaz de se expressar de forma clara e compreensível para Seus discípulos.
O que Ele estava revelando é que escolheria o caminho humilde e doloroso do Filho do Homem, em contraste com o esplendor de um “filho de Davi”. Jesus rejeitou a violência, não tinha um lugar onde repousar, foi condenado à morte e executado na cruz. Na Última Ceia, movido por amor, entregou Seu corpo e Seu sangue para a redenção de todos. Ele também se comparou ao grão de trigo que, ao cair na terra e morrer, produz muito fruto.
Receber o pão e o vinho do Filho do Homem é unir-se ao Seu destino. Estais dispostos a beber o cálice que Ele bebeu? A jornada de seguir a Cristo é um convite à auto-renúncia e ao compromisso profundo com Seu exemplo de amor e sacrifício. Jesus nos chama a identificarmos com Sua missão e a abraçar um caminho de entrega e serviço.
QUANDO COMUNGAR É PERIGOSO
Comungar neste contexto representa um desafio profundo para nosso “ego”. Não se trata apenas de um ato ritual, mas de um convite a uma transformação radical. Comungar é, na essência, uma prática que exige que nos neguemos a nós mesmos, que carreguemos nossa cruz e que nos comprometermos a seguir Jesus com total dedicação.
Este ato de comungar nos leva a reconhecer que, assim como o grão de trigo que cai na terra e morre, só através da entrega e do sacrifício é que podemos realmente produzir frutos significativos. É uma jornada de renúncia pessoal e de compromisso com o caminho de Cristo, onde o ego é desafiado a se submeter a algo maior.
A verdadeira comunhão com Cristo não é apenas um gesto externo, mas uma transformação interna que nos desafia a abandonar nossas próprias vontades e a nos unir ao Seu exemplo de amor e sacrifício. Ao comungarmos, estamos, na verdade, sendo chamados a uma vida de serviço e dedicação, reconhecendo que é na morte para nós mesmos que encontramos a verdadeira vida e abundância.
Assim, ao refletirmos sobre o significado profundo de comungar, somos convidados a considerar como estamos dispostos a nos despojar do nosso ego e a seguir o caminho de Cristo com coragem e fé.
CONCLUSÃO
Não nos acostumemos a comungar de forma mecânica! Devemos, como o centurião, dirigir-nos a Jesus com humildade, dizendo: “Senhor, eu não sou digno, mas diga uma só palavra.” Ou, como Jesus no Jardim das Oliveiras, dirigir-nos a Deus Pai: “Pai, se possível, afasta de mim este cálice, este pão eucarístico, mas que não se faça a minha vontade, e sim a Tua.”
Quando Jesus falou sobre comer Sua carne e beber Seu sangue, muitos de Seus seguidores se afastaram, incapazes de compreender a profundidade de Seu convite. Que isso não aconteça conosco!
Que nossa participação na Eucaristia seja um verdadeiro encontro de fé e entrega, um compromisso consciente e profundo com a vontade divina. Em cada comunhão, busquemos não apenas receber, mas viver plenamente o mistério do sacrifício de Cristo, permitindo que Ele transforme nossos corações e nossas vidas.
Texto: JOSÉ CRISTO REY GARCÍA PAREDES
Fonte: ECOLOGÍA DEL ESPÍRITU