SOLENIDADE DA SANTA MARIA, MÃE DE DEUS (AN0 B)

A PALAVRA

Oito dias após a celebração do Natal de Jesus, a liturgia nos convida a contemplar Maria, a MÃE DE DEUS (“Theotókos”), solenemente designada com esse título no Concílio de Éfeso, em 431. Com o seu “SIM”, ela tornou possível a presença de Jesus em nossas vidas e no nosso mundo.

Este dia também marca o primeiro dia do ano civil de 2024: é o início de uma jornada que desejamos percorrer de mãos dadas com esse Deus que nos ama, nos abençoa e que guiará nossos passos com o cuidado de um Pai ao longo deste Ano Novo.

Também celebramos o DIA MUNDIAL DA PAZ: em 1968, o Papa Paulo VI propôs aos homens de boa vontade que, no primeiro dia de cada novo ano, se rezasse pela paz no mundo. Hoje, portanto, pedimos a Deus que nos conceda a paz e faça de cada um de nós testemunha e arauto da reconciliação e da paz. O tema proposto pelo Papa Francisco para este ano é: “INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E PAZ”.

As leituras que a liturgia deste dia nos apresenta abrangem essa diversidade de temas e evocações.

A primeira leitura (Nm 6,22-27) oferece-nos, por meio de uma antiga fórmula de bênção, a certeza da presença contínua de Deus ao nosso lado nos caminhos que percorremos todos os dias. Ele será sempre para nós fonte de vida e paz.

Na segunda leitura (Gl 4,4-7), evoca-se o amor e o cuidado de Deus, manifestados inúmeras vezes na história dos homens. Ele enviou o seu Jesus ao nosso encontro para nos libertar da escravidão e nos tornar seus “FILHOS”. Nessa condição privilegiada de “FILHOS” livres e amados, podemos dirigir-nos a Deus e chamá-lo de “ABBÁ” (“PAPÁ”).

O Evangelho (Lc 2,16-21) mostra como a presença de Deus em nossa história é fonte de alegria e esperança para todos os homens e mulheres, especialmente para os pobres e marginalizados. Sugere ainda que Maria, a mãe de Jesus, é o modelo do crente que, em silêncio e sem alarde, acolhe as propostas de Deus, guarda-as no coração e deixa-se guiar por elas.    

Fonte: Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus 

Leituras

À frente de um novo ano, enfrentaremos as diversas experiências humanas: alegrias, tristezas, esperanças, desilusões, encantos e desencantos. Apesar disso, a certeza de que não estamos sozinhos perdura. O texto do livro dos Números destaca a presença amorosa de um Deus que guia nossas vidas, oferecendo consolo diário e orientação para a verdadeira vida. A referência à “bênção” divina, mencionada no livro dos Números, ressalta que a transformação positiva só ocorre quando recebemos os dons de Deus com amor e gratidão. O convite é para estar aberto às orientações divinas, permitindo a transformação e trilhando caminhos de felicidade e paz neste novo caminho que se inicia.

22 O Senhor falou a Moisés, dizendo:
23 “Fala a Aarão e a seus filhos:
Ao abençoar os filhos de Israel, dizei-lhes:
24 O Senhor te abençoe e te guarde!
25 ‘O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face,
e se compadeça de ti!
26 O Senhor volte para ti o seu rosto
e te dê a paz!’
27 Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel,
e eu os abençoarei”.
Palavra do Senhor.

O Salmo expressa um apelo à compaixão divina e uma súplica pela bênção de Deus, pedindo que Sua luz brilhe sobre todos. Celebra a justiça divina, convidando as nações a regozijarem-se, reconhecendo o domínio justo de Deus sobre a terra. A mensagem central é a busca pela misericórdia divina, a celebração da justiça e a aspiração à bênção de Deus.

R. Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção.

2 Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção, *
e sua face resplandeça sobre nós!
3 Que na terra se conheça o seu caminho *
e a sua salvação por entre os povos. R.

5 Exulte de alegria a terra inteira, *
pois julgais o universo com justiça;
os povos governais com retidão, *
e guiais, em toda a terra, as nações. R.

6 Que as nações vos glorifiquem, ó Senhor, *
que todas as nações vos glorifiquem!
8 Que o Senhor e nosso Deus nos abençoe, *
e o respeitem os confins de toda a terra! R

Reconhecer-nos como “FILHOS” de Deus estabelece uma conexão fundamental com todos os outros seres humanos, igualmente “filhos” divinos. Compartilhamos a mesma essência divina. Essa constatação levanta questões concretas: devemos marginalizar os outros com base em diferenças? Devemos nos importar com o bem e o mal que afetam nossos irmãos? Surge a obrigação de responsabilidade por cada pessoa em nosso caminho. A mensagem destaca a unidade fundamental entre os seres humanos, questionando atitudes discriminatórias e enfatizando a responsabilidade e solidariedade para com todos como “FILHOS” de Deus.

Irmãos:
4 Quando se completou o tempo previsto,
Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher,
nascido sujeito à Lei,
5 a fim de resgatar os que eram sujeitos à Lei
e para que todos recebêssemos a filiação adotiva.
6 E porque sois filhos,
Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, 
que clama: Abá – ó Pai!
7 Assim já não és mais escravo, mas filho;
e se és filho, és também herdeiro:
tudo isso, por graça de Deus.
Palavra do Senhor.

No Menino frágil em Belém, Deus abraça nossa humanidade, trazendo salvação e paz. O Evangelho adverte contra colocar esperança em ideologias, líderes, dinheiro ou armas. A verdadeira salvação está em Jesus e Sua proposta. Ao contemplar o Menino, somos desafiados a fazer dele nossa referência, optando por uma vida mais digna e solidária. O convite é para viajar com Jesus, aceitando caminhos novos de realização. O Evangelho questiona se estamos dispostos a um novo começo com Jesus neste Ano Novo.

Naquele tempo,
16 os pastores foram às pressas a Belém
e encontraram Maria e José,
e o recém-nascido, deitado na manjedoura.
17 Tendo-o visto, contaram o que lhes fora dito
sobre o menino.
18 E todos os que ouviram os pastores
ficaram maravilhados com aquilo que contavam.
19 Quanto a Maria, guardava todos estes fatos
e meditava sobre eles em seu coração.
20 Os pastores voltaram, glorificando e louvando a Deus
por tudo que tinham visto e ouvido,
conforme lhes tinha sido dito.
21 Quando se completaram os oito dias
para a circuncisão do menino,
deram-lhe o nome de Jesus,
como fora chamado pelo anjo antes de ser concebido.
Palavra da Salvação.

Reflexão

UM ANO NOVO COM NOVO CORAÇÃO

Ao refletir sobre o ano que se encerrou, percebemos que a lista de guerras, represálias, vinganças, catástrofes, corrupções e fraudes se estendeu. Continuamos a causar danos ambientais a este planeta, e cada um carrega consigo sua própria coleção de sofrimentos, fracassos, desenganos, projetos não realizados e aspectos que gostaríamos de ter mudado. No entanto, esses desafios persistem teimosamente, como sempre.

PESSIMISTAS? CANSADOS? DERROTADOS? OU MAIS ESPERANÇOSOS?

Algo positivo também ocorreu. Crescemos em algum aspecto, alcançamos metas, recebemos boas notícias que aqueceram nossos corações, iniciamos novas amizades e experienciamos surpresas agradáveis. Se nos fixarmos apenas nas más notícias, os sucessos, bênçãos e alegrias podem parecer pequenos e frágeis.

Acredito que fomos capazes de reconhecer o que de bom aconteceu e expressar nossa gratidão. Desde sua infância, Maria soube alegrar-se, agradecer e louvar a Deus por todas as obras realizadas nela, por ela e com ela.

Os sinceros desejos que surgem ao contemplarmos a primeira folha do calendário são mais do que meros sonhos ou frases prontas? Será que realmente seremos mais felizes neste novo ano, tanto nós quanto aqueles que compartilham o caminho conosco?

Talvez nossa saúde ou a de um ente querido nos cause alguma preocupação. A fragilidade humana nos faz temer desgostos e decepções indesejados. É quase certo que falharei com alguém e talvez não esteja à altura das circunstâncias. Conflitos pessoais podem persistir, assim como algumas manias em minha personalidade. Não serão poucos os desafios herdados do ano que se encerrou…

ENTÃO, TEM SENTIDO ESSES BRINDES, ESPERANÇAS, E BONS DESEJOS E PROPÓSITOS?

Este ano recém-iniciado não será mais feliz simplesmente porque os eventos nos parecem favoráveis, mas sim porque observamos e sentimos as coisas a partir do CORAÇÃO de uma maneira nova e favorável. A felicidade não está fora, no que acontece ou no que experimentamos, mas sim dentro de nós, em nosso próprio ser. Não está na saúde, na sorte, no sucesso ou na riqueza, mas sim na forma como nos posicionamos diante delas, no que fazemos com cada situação que enfrentamos. A felicidade, a paz do CORAÇÃO, a ilusão, o equilíbrio, o bem-estar não dependem fundamentalmente dos outros, mas sim de nós mesmos, do que fazemos com tudo isso, de como encaramos as coisas e as situações.

O Evangelho nos relata: Maria conservava todas essas coisas e as meditava em seu coração’.

Recordava (perpassando pelo CORAÇÃO e meditava sobre tudo o que acontecia diante de seus olhos, buscando aprender, compreender e deixar-se afetar pelo que ocorria aos demais. Era uma mulher de profundidade, de CORAÇÃO.

O CORAÇÃO não é um álbum de fotos, a ser revisitado de tempos em tempos com nostalgia, ou talvez com raiva. É um espaço de discernimento, separação e clarificação, onde se distingue o manancial de vida daquilo que nos envolve em morte, o mal do bem. Este é o lugar destinado a buscar e aprofundar o significado de todas as coisas: nem tudo tem o mesmo valor para a vida humana e a glória de Deus.

É também o local para questionar como lidar com a dor, o desconcerto e as respostas que não atendem às nossas expectativas. É onde decidimos preservar a serenidade, manter a fidelidade aos nossos valores e compromissos, e tomar decisões para promover mudanças que dependem de nós. Não devemos permitir que os acontecimentos nos prendam, mas sim afirmar o que é importante e irrenunciável, mantendo assim o nosso rumo.

No CORAÇÃO reside o mesmo DEUS QUE É AMOR; somos Seu templo. Santo Agostinho deixou escrito: ‘Deus está comigo no mais profundo do meu próprio coração’. O rosto de Deus agora se reconhece no ser humano, nascido de mulher, para estar mais ao nosso alcance, para que O compreendamos melhor, para que O sintamos próximo e para que nos aproximemos uns dos outros. Ele se esconde no mais profundo do homem para que o descubramos, tanto em nós mesmos quanto “NO OUTRO“.

Deus não precisa mais do que olhar o CORAÇÃO para saber como estamos, mesmo que, às vezes, os sinais de Sua presença sejam singelos e cotidianos: como um menino pobre envolto em fraldas, com os braços de Seus pais como único berço e abrigo.

Quando O contemplamos a partir do silêncio do CORAÇÃO, conforme nos ensinou Sua Mãe, sentimos que Ele nos deixa uma presença discreta que nos transforma e alegra, que nos anima, fortalece e pacifica.

Por isso, quero convidá-los hoje a fazer deste um ‘ANO DO CORAÇÃO’. Imagine como será diferente se começarmos a nos comunicar ‘com o CORAÇÃO na mão’.

Deixemos o CORAÇÃO nas pequenas e grandes coisas que fazemos!
Deixemos que os gestos daqueles que nos querem bem alcancem nosso CORAÇÃO!
Devemos abrir o CORAÇÃO a quem precisa entrar nele!
Guardemos as coisas no CORAÇÃO e meditemos na companhia de Deus!
Deixemos que a miséria e a dor dos outros ressoem e encontrem resposta em nosso interior!

É nisso que está o segredo da felicidade, da paz, do amor que preenche e faz feliz!

Por isso, mais do que desejar um simples “FELIZ ANO“, queremos expressar o desejo de cultivar um CORAÇÃO como o de Maria – a Mulher forte, a Mãe de Deus –, capaz de viver plenamente a cada momento. Um CORAÇÃO que acolhe e reflete os valores de Deus, pois sabemos que ’se Deus está conosco…’.  Quando o CORAÇÃO humano se liberta de entulhos, ervas daninhas e pedregulhos, inevitavelmente emerge o Rosto de Deus, sorrindo, iluminando, protegendo e criando comunhão, fazendo florescer a paz, a justiça, a retidão e a alegria.

Quando o CORAÇÃO humano está vigilante e “GUARDA AS COISAS NELE“, torna-se receptivo aos gestos divinos: ‘Eis aqui a serva do Senhor’. Que essa docilidade se transforme em fecundidade e bênção – bendito seja o fruto do teu ventre.

Quando o CORAÇÃO humano deixa-se iluminar pelo Espírito, descobre que não está só, podendo proclamar: ABBÁ! MÃE! IRMÃOS!

Maria, a mulher que nos proporcionou o encontro com Jesus, é o exemplo do crente sensível aos desígnios de Deus. Ela sabe interpretar os sinais divinos na história, aceita acolher a proposta de Deus em seu CORAÇÃO e colabora com Ele na realização do projeto divino de salvação para o mundo.

Texto: Comunidade católica Ciudad Redonda (Missionários Claretianos) 
Imagem: Oracion Continua