SAGRADA FAMÍLIA DE JESUS, MARIA E JOSÉ DO NATAL (ANO B)

A PALAVRA

A liturgia deste domingo propõe-nos a família de Jesus como exemplo e modelo das nossas comunidades familiares… Como a família de Jesus – diz-nos a liturgia deste dia – as nossas famílias devem viver numa atenção constante aos desafios de Deus e às necessidades dos irmãos.

O Evangelho (Lucas 2,22-40) põe-nos diante da Sagrada Família de Nazaré apresentando Jesus no Templo de Jerusalém. A cena mostra uma família que escuta a Palavra de Deus, que procura concretizá-la na vida e que consagra a Deus a vida dos seus membros. Nas figuras de Ana e Simeão, Lucas propõe-nos também o exemplo de dois anciãos de olhos postos no futuro, com a capacidade de perceber os sinais de Deus e de testemunhar a presença libertadora de Deus no meio dos homens.

A segunda leitura (Colossenses 3,12-21) sublinha a dimensão do amor que deve brotar dos gestos dos que vivem “EM CRISTO” e aceitaram ser “HOMEM NOVO”. Esse amor deve atingir, de forma muito especial, todos os que conosco partilham o espaço familiar e deve traduzir-se em determinadas atitudes de compreensão, de bondade, de respeito, de partilha, de serviço.

A primeira leitura (Eclesiástico 3,3-7.14-17a) apresenta, de forma muito prática, algumas atitudes que os filhos devem ter para com os pais… É uma forma de concretizar esse amor de que fala a segunda leitura.

Fonte: Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus

Leituras

3Deus honra o pai nos filhos
e confirma, sobre eles, a autoridade da mãe.
4Quem honra o seu pai,
alcança o perdão dos pecados;
evita cometê-los
e será ouvido na oração quotidiana.
5Quem respeita a sua mãe
é como alguém que ajunta tesouros.
6Quem honra o seu pai,
terá alegria com seus próprios filhos;
e, no dia em que orar, será atendido.
7Quem respeita o seu pai, terá vida longa,
e quem obedece ao pai é o consolo da sua mãe.
14Meu filho, ampara o teu pai na velhice
e não lhe causes desgosto enquanto ele vive.
15Mesmo que ele esteja perdendo a lucidez,
procura ser compreensivo para com ele;
não o humilhes, em nenhum dos dias de sua vida,
a caridade feita a teu pai não será esquecida,
16mas servirá para reparar os teus pecados
17ae, na justiça, será para tua edificação.
Palavra do Senhor

Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!

1Feliz és tu se temes o Senhor*
e trilhas seus caminhos!
2Do trabalho de tuas mãos hás de viver,*
serás feliz, tudo irá bem! 

Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!

3A tua esposa é uma videira bem fecunda*
no coração da tua casa;
os teus filhos são rebentos de oliveira*
ao redor de tua mesa. 

Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!

4Será assim abençoado todo homem*                   
que teme o Senhor.
5O Senhor te abençoe de Sião,*
cada dia de tua vida. 

Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!

Irmãos:
12Vós sois amados por Deus,
sois os seus santos eleitos.
Por isso, revesti-vos de sincera misericórdia,
bondade, humildade, mansidão e paciência,
13suportando-vos uns aos outros
e perdoando-vos mutuamente,
se um tiver queixa contra o outro.
Como o Senhor vos perdoou,
assim perdoai vós também.
14Mas, sobretudo, amai-vos uns aos outros,
pois o amor é o vínculo da perfeição.
15Que a paz de Cristo reine em vossos corações,
à qual fostes chamados como membros de um só corpo.
E sede agradecidos.
16Que a palavra de Cristo, com toda a sua riqueza,
habite em vós.
Ensinai e admoestai-vos uns aos outros com toda a
sabedoria.
Do fundo dos vossos corações, cantai a Deus
salmos, hinos e cânticos espirituais,
em ação de graças.
17Tudo o que fizerdes, em palavras ou obras,
seja feito em nome do Senhor Jesus Cristo.
Por meio dele dai graças a Deus, o Pai.
18Esposas, sede solícitas para com vossos maridos,
como convém, no Senhor.
19Maridos, amai vossas esposas
e não sejais grosseiros com elas.
20Filhos, obedecei em tudo aos vossos pais,
pois isso é bom e correto no Senhor.
21Pais, não intimideis os vossos filhos,
para que eles não desanimem.
Palavra do Senhor.

22Quando se completaram os dias
para a purificaçóo da mãe e do filho,
conforme a Lei de Moisés,
Maria e José levaram Jesus a Jerusalém,
a fim de apresentá-lo ao Senhor.
39Depois de cumprirem tudo, conforme a Lei do Senhor,
voltaram à Galiléia, para Nazaré, sua cidade.
40O menino crescia e tornava-se forte,
cheio de sabedoria;
e a graça de Deus estava com ele.
Palavra da Salvação.

Reflexão

“SAGRADA” FAMÍLIA

Não é fácil falar hoje sobre a “FAMÍLIA”, com tantas suscetibilidades, tantos modelos diferentes, tantas experiências diferentes, nem todas positivas… Mas já sabemos que “ONDE HÁ AMOR, ALI ESTÁ DEUS”. E se colocarmos o adjetivo “SAGRADA” antes disso, é ainda mais difícil. Exceto em dias como hoje, é raro os pregadores levarem em consideração a família, o casamento e tantos aspectos que fazem parte dele. Porém, a realidade familiar (seja ela qual for) faz parte da experiência de cada ser humano e também dos crentes.

Creio que hoje é o dia, sobretudo para encorajar, acompanhar e orar por todas as famílias e deixar de lado julgamentos sobre os diferentes “ESTILOS” familiares, e mensagens apocalípticas sobre a crise familiar…

Esses dias de Natal são, por definição, “dias FAMILIARES“. O esforço de se reunir em torno de uma mesa, ou de visitar, ou de fazer uma chamada telefônica ou uma videoconferência, ou dar presentes é evidente… Estes tempos do CORONAVÍRUS tem condicionado e limitado tanto esses encontros!

No entanto, também são dias em que surgem dificuldades e conflitos latentes ou ocultos em outras épocas do ano. Porque, uma vez que estamos juntos surgem os questionamentos:  de que falamos? O que temos a dizer um ao outro? Como evitamos tocar em certos tópicos e evitar faíscas? São dias em que se torna mais visível o sofrimento de famílias desestruturadas, onde os filhos estão divididos entre o pai e a mãe. Estes são dias em que nos lembramos tristemente daqueles que se foram. E são dias em que quem não tem a família por perto, por qualquer motivo, se sente especialmente sozinho.         

É verdade que nem tudo é sofrimento e que, quando uma família se dá bem, é uma das maiores fontes de alegria, equilíbrio, segurança, ternura… MAS O QUE ACONTECE QUANDO AS COISAS NÃO CORREM BEM? Não há direito de reconstruir, de tentar curar feridas e buscar estabilidade de outras maneiras?

Quando tratamos sobre a educação dos filhos, surge a pergunta: “Por que os filhos não vêm a este mundo com um manual de instruções debaixo do braço?” Às vezes por excesso, às vezes por omissão, não é incomum que muitos pais sintam que não estão educando bem, ou percebam tarde demais, ou se sintam culpados,  os filhos ou negligenciem porque “é muito difícil“…

O que as leituras de hoje podem contribuir para este tema da vida familiar?

  • Em primeiro lugar, podemos começar dizendo que os Evangelhos nunca chamam a família de Jesus ou qualquer outra família de “SAGRADA“. Por outro lado, chama a atenção que da boca de Jesus nunca aparecem as palavras “pai” ou “mãe” para se dirigir a José ou Maria, nem “irmão” para se referir a seus parentes próximos, como era costume na cultura judaica. Jesus somente chama DEUS de “PAI“. E ele pede expressamente a seus discípulos que não chamem ninguém de Pai, mais somente a Deus. Quanto à sua mãe, ele apenas se refere a ela como do alto da cruz, para encarregar ao discípulo amado que cuide dela. Quanto ao nome “irmão”, ele o reserva para os discípulos, que devem tratar-se assim entre si: “Se te lembras que TEU IRMÃO tem alguma coisa contra ti”, “entre vós sois TODOS IRMÃOS”, “quem é minha mãe? e meus irmãos? Aqueles que escutam a minha palavra e a cumprem…

É a maneira de nos dizer que a “FAMÍLIA” verdadeira, a cristã, é muito maior do que aquela que vem pelos laços de carne e sangue. Portanto, a “FAMÍLIA” tem que sair de si mesma para colocar o “calor de casa” neste mundo tão pouco familiar. E que, portanto, não entrou em seu projeto de fazer da própria família uma espécie de fortaleza, bolha ou refúgio para os tempos difíceis: Nós, e os nossos, aqueles com quem nos relacionamos bem e não nos causam problemas… “SE VOCÊ AMA AQUELES QUE TE AMAM, O QUE HÁ DE EXTRAORDINÁRIO EM VOCÊ?” Seus discípulos são chamados a multiplicar pais, mães, irmãos, avós em nosso ambiente cristão e social. Trata-se de difundir e triunfar os laços de amor, todas aquelas coisas que fazem parte da vida familiar: diálogo, acolhida, perdão, serviço, detalhes, sacrifício, etc. Dentro e fora de casa

  • Em segundo lugar, podemos considerar e chamar uma família de “SAGRADA” quando é consagrada a Deus. Quer dizer: quando Deus está muito presente nela, quando contamos com Ele na solução dos problemas e nas decisões de cada dia… A oração, a escuta da Palavra, o diálogo em busca conjunta da vontade de Deus é agora indispensável em cada família que quer se chamar de cristã, o perdão mútuo. Provavelmente os pastores da Igreja não colocaram muita energia para ensinar e acompanhar tudo isso. Mas também é verdade que não são poucas as famílias que consideram que basta estar juntas, morar sob o mesmo teto, comer da mesma geladeira e, quando possível, juntas. Quão fundamentais são os grupos de casais refletindo, compartilhando e aprendendo juntos com suas experiências! Provavelmente na paróquia você os tem, ou pode propor que sejam iniciados.
  • Em terceiro lugar, as leituras enfatizam que as crianças não são propriedade de seus pais. “APRESENTÁ-LOS” a Deus (é algo “semelhante” ao nosso batismos) foi a forma de Israel sublinhar o respeito infinito que eles merecem. Os filhos não são chamados para ser a “imagem e semelhança” de seus pais, ou para cobrir ausências emocionais quando outras pessoas estão desaparecidas. Embora devamos também afirmar que não são os filhos que interferem na vida dos pais, nem estão à sua inteira disposição e, por vezes, são exigidos deles coisas que não lhes correspondem.

Aos pais é confiada uma “TAREFA SAGRADA“: ajudá-los a conhecer e viver Deus, a servi-lo. As crianças têm que crescer e se fortalecer (como diz o Evangelho de Jesus), mas também “na sabedoria e na graça”. Essa “SABEDORIA” da qual as Escrituras falam se refere à sabedoria de aprender com a vida e aprender a enfrentar pessoalmente as dificuldades e desafios que a vida apresenta. Uma sabedoria existencial.

Finalmente: os cristãos (como indivíduos, como comunidades e como Igreja) devem apoiar as famílias (seja qual for o modelo que escolherem), dar compreensão quando surgirem dificuldades, abrir caminhos, acolher… e fazer menos julgamentos e imposições. Todos nós devemos levar muito mais a sério CONSTRUIR uma família e também CONSTITUIR a grande Família da Igreja. Como diz um provérbio africano: “PARA EDUCAR UMA CRIANÇA VOCÊ PRECISA DE TODA A TRIBO.

Texto: MARTÍNEZ DE LA LAMA-NORIEGA, CMF
Imagem: PIXABAY