
A oração não é um monólogo solene, mas um encontro de corações. Como nos relacionamos com Deus? Será que O procuramos apenas nos momentos de crise, ou cultivamos uma conversa contínua, onde partilhamos não só as dores, mas também as alegrias, os sonhos e até as nossas revoltas? A Palavra deste domingo nos convida a refletir sobre a qualidade do nosso diálogo com o Divino.
Abraão, na Primeira Leitura (Gn 18,20-32), oferece um modelo surpreendente: ele fala com Deus com a confiança de um amigo, mas também com a ousadia de quem busca respostas. Não teme questionar, expor suas inquietações. E Deus, longe de se ofender, responde com transparência, revelando Seus planos. Aqui está o segredo: a oração autêntica nasce da sinceridade. Não são as palavras perfeitas que importam, mas a verdade que carregam. Quantas vezes, por medo ou formalismo, evitamos ser francos com Aquele que conhece até nossos silêncios?
No Evangelho (Lc 11,1-13), Jesus nos revela um Pai que não é um juiz distante, mas um amor sempre aberto aos filhos. “Pedi e recebereis“, diz Ele – não como garantia de desejos atendidos, mas como promessa de que seremos ouvidos. Orar é, antes de tudo, confiar. É como a criança que traz ao pai tanto seus medos noturnos quanto seus risos despreocupados, certa de que será acolhida. E mais: Jesus nos ensina a orar em sintonia com a vontade de Deus. Não se trata de impor nossos planos, mas de nos abrirmos aos d’Ele.
Paulo, por sua vez, lembra aos Colossenses na Segunda Leitura (Cl 2,12-14) – e a nós – que a oração se completa na coerência da vida. De que adianta falar com Deus se nossos passos O negam? A verdadeira intimidade com Ele transforma.
Então, hoje, perguntemo-nos: minha oração é um refúgio de autenticidade? Escuto tanto quanto falo? E, ao levantar-me, levo no coração a certeza de que, em cada palavra trocada, Deus não só me ouve, mas me espera?
Leituras
‘Que o meu Senhor não se irrite, se eu falar’ – como Abraão, ousemos trazer a Deus nossas dúvidas e anseios, pois só no diálogo sincero a fé se torna caminho de luz em tempos incertos.
e agravou-se muito o seu pecado.
ao clamor que chegou até mim”.
Não pouparias o lugar
por causa dos cinquenta justos que ali vivem?
como se o justo fosse igual ao ímpio.
Longe de ti!
O juiz de toda a terra não faria justiça?”
pouparia por causa deles a cidade inteira”.
eu que sou pó e cinza.
O Senhor respondeu:
“Não destruiria,
se achasse ali quarenta e cinco justos”.
Ele respondeu:
“Por causa dos quarenta, não o faria”.
E se houvesse apenas trinta justos?”.
Ele respondeu:
“Também não o faria, se encontrasse trinta”.
e se houver vinte justos?”
Ele respondeu:
“Não a iria destruir por causa dos vinte”.
se eu falar só mais uma vez:
e se houvesse apenas dez?”
Ele respondeu:
“Por causa dos dez, não a destruiria”.
Palavra do Senhor.
‘Naquele dia em que gritei, vós me escutastes, ó Senhor!’ – mesmo em nossos clamores mais frágeis, Deus inclina Seu ouvido, transformando desespero em esperança e silêncio em resposta amorosa.
R. Naquele dia em que gritei, vós me escutastes, ó Senhor!
1 Ó Senhor, de coração eu vos dou graças, *
porque ouvistes as palavras dos meus lábios!
Perante os vossos anjos vou cantar-vos *
2a e ante o vosso templo vou prostrar-me. R.
b Eu agradeço vosso amor, vossa verdade, *
c porque fizestes muito mais que prometestes;
3 naquele dia em que gritei, vós me escutastes *
e aumentastes o vigor da minha alma. R.
6 Altíssimo é o Senhor, mas olha os pobres, *
e de longe reconhece os orgulhosos.
7a Se no meio da desgraça eu caminhar, *
vós me fazeis tornar à vida novamente;
b quando os meus perseguidores me atacarem *
e com ira investirem contra mim,x
estendereis o vosso braço em meu auxílio.
7c e havereis de me salvar com vossa destra. R.
8 Completai em mim a obra começada; *
ó Senhor, vossa bondade é para sempre!
Eu vos peço: não deixeis inacabada *
esta obra que fizeram vossas mãos! R.
No batismo, mergulhamos na morte do egoísmo e ressurgimos em Cristo, pois “Deus vos trouxe para a vida, junto com Cristo, e a todos nós perdoou os pecados”, restaurando-nos na misericórdia divina.
por meio da fé no poder de Deus,
que ressuscitou a Cristo dentre os mortos.
até que Deus vos trouxe para a vida, junto com Cristo,
e a todos nós perdoou os pecados.
e a eliminou, pregando-a na cruz.
Palavra do Senhor.
‘Pedi e recebereis’ – pois o Pai não dá pedras a quem pede pão, mas derrama Seu Espírito sobre os filhos que O buscam com coração humilde e confiante.
“Senhor, ensina-nos a rezar,
como também João ensinou a seus discípulos”.
‘Pai, santificado seja o teu nome.
Venha o teu Reino.
e não nos deixes cair em tentação'”.
e for procurá-lo à meia-noite e lhe disser:
‘Amigo, empresta-me três pães,
e meus filhos e eu já estamos deitados;
não me posso levantar para te dar os pães’;
para dá-los porque é seu amigo,
e lhe dará quanto for necessário.
batei e vos será aberto.
quanto mais o Pai do Céu dará o Espírito Santo
aos que o pedirem!”
Palavra da Salvação.
Homilia
NÃO SABEMOS ORAR CORRETAMENTE
Há pessoas que parecem nunca sentir necessidade de orar. Outras, ao contrário, vivem pedindo, sem cessar. Mas, no fim, a grande pergunta permanece: o que significa orar? Como orar de modo verdadeiro, como convém a Deus?
Dividiremos esta homilia em três partes:
- Orar é ultrapassar os próprios limites, não “negociar com Deus”;
- Orar é descobrir as forças do Espírito que já nos foi dado;
- Orar é um encontro sagrado, com troca de dons.

Orar é ultrapassar os próprios limites, “não negociar com Deus”
Quando um ser humano se coloca em oração, ele ultrapassa seus próprios limites. Reconhece-se frágil, carente, dependente. Quem reza abre espaço para Deus agir. Abraão, na primeira leitura, apresentou a Deus uma oração que parece uma negociação. Mas a oração que Jesus nos ensinou é diferente: nosso Deus conhece cada desejo do nosso coração… é preciso confiar e deixar Deus ser Deus.
Não se trata de “pedir a Deus que nos dê lucidez”, mas de descobrir que somos lúcidos à medida que nos deixamos habitar pela sua divina presença.
A oração não é uma barganha com o céu, mas uma tomada de consciência do nosso verdadeiro ser, feito à imagem do Divino. Não precisamos convencer uma divindade exterior; é preciso silenciar o ego, para que aflore o nosso Eu mais profundo – aquele em que Deus habita.
“Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e viremos a ele, e faremos nele a nossa morada” (Jo 14,23).
Orar é descobrir os poderes do Espírito que habita em nós
Na Carta aos Colossenses, somos recordados de que, ao aderirmos a Cristo pela fé e pelo batismo, algo velho em nós morreu e algo absolutamente novo começou a viver. Fomos agraciados com um princípio de Vida, com letra maiúscula.
O Espírito de Jesus passou a habitar em nós – é Ele quem nos faz viver. A sentença de condenação foi anulada: “Deus vos trouxe para a vida, junto com Cristo, e a todos nós perdoou os pecados” (Cl 2,12-14).
Deus não tem nada contra nós. O que transborda do coração divino é apenas amor, compaixão, ternura, aliança que nunca se quebra.
Mas quem, tendo olhos, se recusa a abrir as pálpebras, como poderá ver? Quem, tendo pernas, permanece inerte sobre a cama, como poderá experimentar a alegria do movimento?
O batismo nos concede capacidades novas, mas cabe a nós exercê-las. Quem se abre à ação do Espírito torna-se, de fato, uma nova criatura.
Orar é uma santa convocação… Com troca de dons
Aquele que reza constrói, dentro de si, uma morada – e nela convida Deus como hóspede de honra. Quem ora reserva um tempo precioso do seu dia para celebrar a mais misteriosa das festas: o encontro com o próprio Deus.
Quando oramos, nosso corpo torna-se templo vivo, nossa casa se transforma em espaço sagrado, e nosso tempo é arrancado do banal para tornar-se eternidade. É nesse lugar e nessa hora que marcamos encontro com Deus – e Ele nunca falta à promessa.
Mas Ele não chega com séquitos ou aparato. Não vêm com Ele os trovões do Sinai, nem as legiões de anjos, tronos ou potestades.
Ele chega sozinho, e se apresenta com um único título: Pai, Mãe, Abbá.
O que então acontece é um encontro familiar, íntimo e profundamente afetuoso – entre o Pai e seu filho, entre a Mãe e sua pequena filha.
Foi isso que Jesus fazia quando rezava. Foi isso que Ele ensinou aos discípulos e discípulas.
O Abbá sempre vem ao encontro. Ele se alegra em se revelar a seus filhos e filhas.
É um Deus que perdoa, que alimenta, que provê todas as coisas e que jamais abandona aqueles que, de coração, se reconhecem como seus filhos.
Conclusão
Diante do mistério da oração revelado por Jesus, somos convidados a abandonar toda ideia de uma relação mecânica com Deus, baseada em trocas e barganhas. Em vez disso, somos chamados a entrar na escola da confiança, da escuta e da intimidade. Orar é, antes de tudo, deixar-se amar, permitir que o Espírito fale em nós e por nós, e viver cada dia como quem se sabe filho ou filha do Abbá.
Ao rezarmos, não estamos diante de um juiz impassível, mas diante de um Pai misericordioso, que se alegra em nos encontrar e que jamais se cansa de escutar nossas súplicas mais sinceras.
“Pedi e recebereis, buscai e encontrareis, batei e vos será aberto” (Lc 11,9): essas palavras não são uma fórmula mágica, mas um convite à perseverança confiante.
Que neste tempo litúrgico, aprendamos a fazer da oração não um dever pesado, mas um encontro esperado; não um discurso ensaiado, mas uma conversa de amor.
E que ao orarmos, como Jesus ensinou, nossos corações se tornem mais humildes, mais abertos, mais semelhantes ao coração do Pai.
Amém.
Texto: JOSÉ CRISTO REY GARCÍA PAREDES
Fonte: ECOLOGÍA DEL ESPÍRITU
Este artigo foi produzido com a assistência de ferramentas de inteligência artificial.