Contemplemos este mistério tocante: o Deus eterno, onipotente, veste-se da fragilidade de um menino. Ele, que sustenta o universo, chora no frio de uma manjedoura em Belém. E onde encontra abrigo? Numa família humana. Não em um palácio, mas no lar simples de José e Maria, dois jovens esposos de uma aldeia obscura da Galileia. Aí está a primeira e revolucionária declaração do Natal: a santidade germina no solo humilde do cotidiano familiar.
A liturgia nos convida a olhar essa Sagrada Família. E a olhemos com atenção e verdade: não é um quadro estático de perfeição irreal, mas um ícone dinâmico de amor fiel. É uma família que conta com Deus. Maria guarda todas as coisas no coração; José escuta e age movido pela fé, mesmo sem compreender totalmente. A sua união não nasce de uma ausência de problemas, mas de uma confiança incondicional que os faz peregrinar juntos, solidários, sem deixar ninguém para trás.
O sábio do Eclesiástico na Primeira Leitura (Eclo 3,3-7.14-17a) nos recorda que honrar pai e mãe é um alicerce divino. Paulo, por sua vez, na Segunda Leitura (Cl 3,12-21) clama para que vistamos nosso ser com misericórdia, bondade e paciência – as vestes cotidianas do “Homem Novo”. Eis o modelo: uma família que se constrói não sobre sentimentos voláteis, mas sobre a decisão diária de perdoar, cuidar e proteger.
E as nossas famílias? A Sagrada Família não está em um pedestal inalcançável. Ela nos estende as mãos desde a sua realidade concreta – com medos, fugas para o Egito, incompreensões – e sussurra: “A santidade está aqui. No tecido rude do perdão, na paciência que veste a irritação, no abraço que acolhe a debilidade.” É no Presépio que aprendemos: Deus quis ter de uma família. E é nas nossas famílias, santuários de amor inacabado, que Ele quer hoje renascer.
Leituras
À luz do Eclesiástico, Quem teme o Senhor, honra seus pais, reconhece neles o dom da vida, cuidando com ternura em sua fragilidade, pois ali se aprende hoje a fidelidade que agrada a Deus.
evita cometê-los
e será ouvido na oração cotidiana.
e, no dia em que orar, será atendido.
não o humilhes, em nenhum dos dias de sua vida,
a caridade feita a teu pai não será esquecida,
Eis que buscamos a felicidade por todos os caminhos, mas ela germina no humilde temor ao Senhor, revelado nos pequenos gestos cotidianos: “Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos” é o segredo esquecido da bênção que floresce em nossa casa.
R. Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!
1 Feliz és tu se temes o Senhor *
e trilhas seus caminhos!
2 Do trabalho de tuas mãos hás de viver, *
serás feliz, tudo irá bem! R.
3 A tua esposa é uma videira bem fecunda *
no coração da tua casa;
os teus filhos são rebentos de oliveira *
ao redor de tua mesa. R.
Em meio aos nossos conflitos, a verdadeira vida familiar nasce quando, revestidos de humildade e perdão, fazemos do lar o primeiro altar, vivendo “no Senhor”, onde cada gesto de paciência se torna oração viva.
Por isso, revesti-vos de sincera misericórdia,
bondade, humildade, mansidão e paciência,
se um tiver queixa contra o outro.
Como o Senhor vos perdoou,
assim perdoai vós também.
E sede agradecidos.
Ensinai e admoestai-vos uns aos outros com toda a
sabedoria.
Do fundo dos vossos corações, cantai a Deus
salmos, hinos e cânticos espirituais,
em ação de graças.
Por meio dele dai graças a Deus, o Pai.
Palavra do Senhor.
Mesmo hoje, quando a ansiedade nos cerca, Deus nos ordena com a mesma urgência amorosa: “Levanta-te, pega o menino e sua mãe e foge para o Egito“, conduzindo-nos através da obscuridade à salvação.
“Levanta-te, pega o menino e sua mãe e foge para o
Egito! Fica lá até que eu te avise!
Porque Herodes vai procurar o menino para matá-lo”.
“Do Egito chamei o meu Filho”.
pois aqueles que procuravam matar o menino
já estão mortos”.
Por isso, depois de receber um aviso em sonho,
José retirou-se para a região da Galileia,
“Ele será chamado Nazareno”.
Palavra da Salvação.
Homilia
A SAGRADA FAMÍLIA NOS ENSINA: PROTEGER, CUIDAR E ACOLHER
Irmãos e irmãs, celebramos hoje a Festa da Sagrada Família de Nazaré: Jesus, Maria e José. No tempo do Natal, a liturgia nos convida a contemplar o mistério de Deus que quis nascer e crescer no seio de uma família humana.
As leituras que proclamamos nos apresentam um belo mosaico: o Eclesiástico nos fala da sabedoria de honrar os pais; o Salmo 127 canta a bênção de uma família que teme o Senhor; São Paulo, na Carta aos Colossenses, detalha as roupas espirituais que devem vestir nossas relações familiares: compaixão, bondade, humildade, mansidão, paciência e perdão. E o Evangelho de Mateus nos mostra essa família santa não em um cenário idealizado, mas em fuga, como refugiada, buscando asilo no Egito para salvar a vida do Menino.
Diante desse quadro, somos levados a perguntar: O que a Sagrada Família, que conheceu o exílio e a insegurança, tem a dizer às nossas famílias hoje, tão marcadas por desafios, mudanças e, por vezes, por rupturas e medos?
A primeira lição que brilha é a da fidelidade e do cuidado entre gerações. O livro do Eclesiástico é incisivo: “Quem honra seu pai obtém o perdão dos pecados”. Num tempo em que a cultura do descartável atinge também os idosos, e em que a pressão do trabalho e do individualismo pode nos afastar dos que nos deram a vida, a Palavra é um alerta cheio de ternura. A honra não é apenas um sentimento vago; é tempo de qualidade, é paciência com as limitações, é gratidão ativa. Quantos avós são hoje a coluna vertebral de tantas famílias, cuidando dos netos enquanto os pais trabalham? Honrá-los é reconhecer seu valor inestimável.
A segunda lição, mais dramática, vem do Evangelho. A Sagrada Família é uma família de migrantes. Eles experimentam o medo, a urgência de partir, a incerteza de um futuro em terra estrangeira. José, ouvindo em sonhos, levanta-se de noite e parte. É a obediência da fé protegendo o dom mais precioso. Hoje, nosso mundo ainda vê milhões de famílias forçadas a fugir de guerras, da fome ou da perseguição. A Sagrada Família nos olha através das manchetes de jornais e nos pergunta sobre nossa acolhida, nossa solidariedade, nossa capacidade de ver o rosto do Menino Jesus no próximo.
E no meio dessas realidades por vezes duras, São Paulo nos oferece o “manual” da convivência santificada: “Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente”. A família não é um museu de santos, mas uma escola de santidade. É onde a paciência se exercita na fila do banheiro de manhã, onde o perdão cura as mágoas depois de uma discussão à mesa, onde o amor é decidido todos os dias, não apenas sentido. É onde se aprende a dizer “por favor”, “obrigado” e “sinto muito”.
Deus escolheu uma família para vir ao mundo. Com isso, santificou o ordinário. O trabalho de José, os afazeres de Maria, os choros, as noites mal dormidas, as preocupações com o sustento – tudo isso foi assumido por Deus. A santidade da Sagrada Família não está em uma vida sem problemas, mas em viver cada situação, até as mais angustiantes, na confiança e na obediência à vontade de Deus. Como nos recorda o Papa Francisco, a família é “Igreja doméstica”, o primeiro lugar onde se transmite a fé “com o exemplo e a palavra, no cotidiano da vida” (Amoris Laetitia, 85).
A fuga para o Egito nos revela um Deus que não poupa sua família das provações, mas que se faz presente dentro delas. José, o homem justo e silencioso, é a imagem de Deus Pai que protege. Maria, que guarda todas as coisas no coração, é modelo de confiança mesmo quando não se compreende o caminho. Jesus, totalmente dependente, santifica a condição de toda criança vulnerável.
CONCLUSÃO
Então, o que nos pede está celebração? Concretamente, três atitudes podem nascer de nossa celebração:
- Olhar para nossa casa com gratidão e responsabilidade.Que tal, nesta semana, fazer um gesto concreto de reconciliação ou de atenção especial a um familiar com quem a convivência está desgastada?
- Olhar para as famílias ao nosso redor com solidariedade.Acolher, apoiar, não julgar. Rezar e agir pelas famílias em dificuldade, pelos casais em crise, pelos que perderam um ente querido.
- Olhar para as famílias refugiadas e migrantes com compaixão ativa.Informar-se, rezar por elas, apoiar iniciativas de acolhimento.
A Sagrada Família não é um modelo inatingível. É um sinal de esperança. Deus habita na normalidade, no trabalho, no cuidado, e até no cansaço e no medo das nossas famílias. Ele aí está, abençoando nossos esforços, curando nossas feridas, fortalecendo nossos laços.
Que São José nos ensine a proteger os nossos, que Maria nos ajude a confiar e que Jesus, que cresceu em “sabedoria, estatura e graça”, abençoe cada lar, transformando-o em um espaço de amor, perdão e paz.
ORAÇÃO FINAL
Sagrada Família de Nazaré, ícone vivo do amor de Deus no cotidiano simples da vida humana, olhai por nossas famílias. Ensinai-nos a viver o amor fiel, que não desiste diante das fragilidades, mas se renova no perdão, no diálogo e na doação cotidiana. Ajudai-nos a cultivar uma esperança inquebrantável, mesmo quando o futuro parece incerto, sustentados pela confiança de que Deus caminha conosco em cada etapa da vida.
Ensinai-nos também a acolhida generosa, capaz de abrir o coração e a casa, de escutar sem julgar e de cuidar com ternura, à semelhança de Maria, que guardava tudo no coração, e de José, que protegeu a vida com coragem silenciosa. Que nossas famílias sejam espaços de paz, onde cada pessoa se sinta amada, respeitada e valorizada.
Sede refúgio para todas as famílias, especialmente as que mais sofrem: as feridas pela divisão, pela violência, pela pobreza ou pela solidão. Amparai os lares marcados pela dor, fortalecei os que lutam para permanecer unidos e devolvei a alegria aos que perderam a esperança. Sagrada Família de Nazaré, conduzi-nos a viver segundo o coração de Deus, para que nossas casas se tornem sinais do seu amor no mundo. Amém.
Este artigo foi produzido com a assistência de ferramentas de inteligência artificial.