
Sobre que valores erguemos a nossa existência? Quantas vezes, no corre-corre da vida, nos deixamos seduzir pela soberba, pela ambição ou pelo desejo de reconhecimento? Mas será que estes são companheiros que nos conduzem à felicidade verdadeira? A liturgia deste domingo nos desafia a olhar para dentro de nós e a perguntar: quais são os alicerces que sustentam a minha vida?
NESTE DOMINGO CELEBRAMOS O DIA DO CATEQUISTA. É belo perceber como a Palavra de Deus ilumina a missão daqueles que, com simplicidade e amor, dedicam-se a transmitir a fé. O catequista é chamado a viver e a ensinar não a lógica da ganância ou do poder, mas a força transformadora da humildade, da fraternidade e da esperança no Reino de Deus.
Na Primeira Leitura (Eclo 3,19-21.30-31), encontramos um sábio judeu que, há mais de dois mil anos, advertia seus irmãos a não se deixarem fascinar pela cultura arrogante e sedutora de seu tempo. Ele recordava que a verdadeira grandeza não está em se impor sobre os outros, mas em permanecer fiel a Deus e em escolher a humildade. Esta virtude não é covardia, mas coragem; não é resignação, mas uma decisão madura de viver com profundidade e sentido.
O Evangelho (Lc 14,1.7-14) nos leva à casa de um fariseu, em plena refeição de sábado. Ali, onde todos disputavam os primeiros lugares, Jesus quebra a lógica do orgulho humano e revela um novo caminho: o do serviço, da simplicidade e do amor gratuito. Ao anfitrião, que se cercava de amigos por interesse, Jesus ensina que o verdadeiro banquete é aquele que acolhe quem nada pode oferecer em troca — os pobres, os doentes, os esquecidos. É assim que se constrói o Reino: pela humildade que acolhe e pelo amor que não calcula vantagens.
Na Segunda Leitura (Hb 12,18-19.22-24ª), somos lembrados de que nossa fé não é apenas doutrina ou tradição, mas uma experiência viva que nos insere na própria família de Deus. Somos chamados a caminhar com alegria e entusiasmo rumo à Jerusalém celeste, já unidos à comunhão dos santos.
Humildade, simplicidade, amor universal: eis os valores que dão sentido à vida. Que este domingo nos inspire, especialmente a nós e aos catequistas, a renovar a escolha por Cristo, pois somente Ele é o fundamento sólido de uma vida plena.
Leituras
Em um mundo que exalta a autossuficiência, a sabedoria eterna nos sussurra: ‘A humildade é o caminho seguro para encontrar graça diante do Senhor‘, transformando nossa fragilidade em luz e nosso serviço em contemplação.
e assim encontrarás graça diante do Senhor.
Muitos são altaneiros e ilustres,
mas é aos humildes que ele revela seus mistérios.
e ele não compreende.
e com ouvido atento deseja a sabedoria.
Palavra do Senhor.
Em meio às dores do mundo e às feridas da solidão, o Senhor desce com ternura, ‘com carinho preparastes uma mesa para o pobre’, revelando que o amor é o verdadeiro alimento que sacia.
R. Com carinho preparastes uma mesa para o pobre.
No caminho da fé, não vos achegais a trevas ou medos, mas ‘vós vos aproximastes do monte Sião e da cidade do Deus vivo’, onde resplandece a esperança que renova e salva.
da reunião festiva de milhões de anjos;
de Deus, o Juiz de todos;
dos espíritos dos justos, que chegaram à perfeição;
Num mundo obcecado por status e primeiros lugares, a provocação de Cristo ecoa: ‘Quem se eleva será humilhado, e quem se humilha será elevado’, convidando-nos à humilde beleza de servir, verdadeiro caminho para a glória.
da reunião festiva de milhões de anjos;
de Deus, o Juiz de todos;
dos espíritos dos justos, que chegaram à perfeição;
Homilia
O ÚLTIMO POSTO
Embora tentemos disfarçar, é inegável que nós, seres humanos, carregamos no âmago um anseio espontâneo pelos primeiros lugares. Individual e coletivamente, tendemos a nos colocar no centro do universo. Occupar a última posição é uma experiência que fere nosso orgulho, e quem, em sã consciência, a desejaria?
Dividirei esta reflexão em quatro atos contemplativos:
- O Ídolo do ‘Eu’ no Centro
- A Sabedoria Secreta da Humildade
- A Revolução dos Últimos
- A Pátria Definitiva: A Jerusalém Celeste

O ÍDOLO DO ‘EU’ NO CENTRO
Desta semente de autoexaltação brota o veneno do etnocentrismo, que cega cada cultura, levando-a a crer-se superior e a impor-se violentamente sobre as demais. Dele nascem os monstros gêmeos do nacionalismo exacerbado e do individualismo. Desejamos, por instinto, ser os primeiros, superar todos, brilhar mais forte. Quando falhamos, buscamos refúgio em alguém que alcançou o cume, como se sua glória pudesse, por osmose, tornar-se também nossa. Este impulso possui uma centelha divina: é o motor que nos impele a crescer e a transcender. Mas sua sombra é longa e tenebrosa: gera a inveja que corrói, a violência que destrói, a guerra que devasta e o terror que paralisa.
A SABEDORIA SECRETA DA HUMILDADE
O Livro do Eclesiástico resplandece com uma sabedoria divina e profundamente humana ao iluminar este abismo em nossa alma. O sábio exorta-nos com paterna urgência: “Filho, realiza tuas obras com mansidão, e serás amado mais do que um homem generoso.” (Eclo 3, 19). A verdadeira grandeza reside em conhecer nossos limites e habitar neles com paz, até mesmo em ‘reduzir-nos’.
Por quê? Para criar um espaço vazio, um vaso capaz de receber o favor gratuito de Deus. O Senhor é o defensor do indefeso, o aplauso para o que vive no anonimato, a justiça restauradora para o que foi esmagado pela injustiça dos homens. É como se Ele estivesse ao nosso lado, sussurrando que Ele mesmo se encarregará de reparar toda a falta de reconhecimento, toda a honra negada. No entanto, nosso Deus não se agrada quando arrancamos esta justiça com nossas próprias mãos, pois a vingança nunca sacia, apenas amplia o vazio.
Em um gesto de intimidade comovente, Deus confia seus segredos mais profundos aos corações humildes. O Altíssimo, que habita nas alturas, inclina-Se com predileção irresistível sobre aqueles que se fazem pequenos, que vivem próximos à terra, no ‘húmus’ fértil da humildade.
A REVOLUÇÃO DOS ÚLTIMOS
Jesus, o Filho do Altíssimo, é a encarnação perfeita desta predileção divina pelos humildes, pelos pequenos, pelos desprezados pelo mundo. Ele elevou um hino de gratidão ao Pai por esconder os mistérios do Reino dos sábios e inteligentes e os revelar aos pequeninos (cf. Lc 10, 21). O evangelho de hoje nos coloca como espectadores de um banquete sabático na casa de um fariseu importante, um microcosmo da nossa busca por status. Enquanto O observam para O acusar, Jesus, com olhar que penetra as almas, vê neles o mesmo reflexo que habita em nós: a ânsia pelos primeiros lugares.
Desta cena cotidiana, Ele extrai um ensinamento que é um bálsamo para a alma ferida: “Todo aquele que se eleva será humilhado, e aquele que se humilha será elevado” (Lc 14, 11).
A estratégia do Reino é invertida: busque o último lugar, não como um cálculo mesquinho para futura promoção, mas como um ato de verdade profunda. Jesus não ensina o que não viveu. Sendo de condição divina, “esvaziou-Se a Si mesmo, assumindo a condição de servo (…) humilhou-Se a Si mesmo, fazendo-Se obediente até à morte, e morte de cruz” (Fl 2, 7-8). Por isso, o Pai O exaltou soberanamente e Lhe deu o Nome que está acima de todo nome.
Eis a força revolucionária da humildade autêntica: não é uma técnica de ascensão social, mas uma rendição confiante que deposita nas mãos do Pai não apenas nossa vida, mas também nossa honra e nosso reconhecimento. Ele é fiel e responderá à nossa pequenez com a Sua grandeza infinita.
Jesus culmina Sua lição com um convite que ecoa através dos séculos: ao dar um banquete, invite os que a sociedade descarta – os pobres, os coxos, os cegos. Faça como o Pai faz. A recompensa não será efêmera como o aplauso humano, mas eterna, porque virá d’Aquele que é a própria Fonte da vida.
A PÁTRIA DEFINITIVA: A JERUSALÉM CELESTE
A Carta aos Hebreus, na segunda leitura, coroa esta reflexão, oferecendo a perspectiva definitiva que ilumina nosso caminho no Tempo Comum. O “último lugar” não é um fim em si mesmo; é a passagem de entrada para a verdadeira Pátria. “Vós vos aproximastes do Monte Sião, da Cidade do Deus vivo, da Jerusalém celestial” (Hb 12, 22). São os humildes de coração, os que escolheram o último lugar por amor a Cristo, quem têm acesso à assembleia festiva dos santos, à comunhão eterna na presença de Deus. É lá, na Jerusalém celeste, que o pobre Lázaro, último entre os últimos na terra, recebe afinal o abraço e o reconhecimento que o mundo lhe negou. É para esta festa eterna, preparada pelo Pai para os seus filhos humildes, que somos convidados a caminhar com esperança inexaurível.**
CONCLUSÃO
Irmãos e irmãs, a liturgia deste Domingo não nos oferece uma simples lição de etiqueta social, mas desvenda o coração do próprio Deus e o caminho paradoxal da salvação. A humildade, tão contracultura em nosso mundo que exalta o poder, o sucesso e a autossuficiência, revela-se não como uma virtude para fracos, mas como a força revolucionária do Evangelho.
O convite de Jesus é claro e radical: imitar a Sua kenosis, o seu esvaziamento por amor. É descer voluntariamente, confiando que é no último lugar, aos pés dos irmãos, que verdadeiramente encontramos o primeiro lugar no abraço do Pai. É confiar que Ele, o Defensor dos humildes, é quem guarda nossa honra e nossa vida. Ele vê aquele que é ignorado, ouve aquele que é silenciado e levanta aquele que se abaixa para servir.
Portanto, saiamos daqui com um propósito concreto: não buscar os primeiros lugares, mas criar espaços à mesa para os últimos. Não cultivar a autorreferencialidade, mas praticar a mansidão do Eclesiástico e a caridade do Evangelho. Que nossa vida se torne um banquete de inclusão, um reflexo da Jerusalém Celeste, para onde caminhamos como peregrinos cheios de esperança. Pois, como nos assegura a Carta aos Hebreus, nossa pátria definitiva não é construída pela conquista, mas acolhida como dom por aqueles que, seguindo o Cordeiro, escolheram o caminho do amor humilde. Que assim seja.
Texto: JOSÉ CRISTO REY GARCÍA PAREDES
Fonte: ECOLOGÍA DEL ESPÍRITU
Este artigo foi produzido com a assistência de ferramentas de inteligência artificial.